terça-feira, novembro 28, 2006

E o eleitor, tem voto na matéria?


Sinto-me indignada com o afastamento de Luísa Mesquita das comissões parlamentares que integrava - de Educação e de Negócios Estrangeiros, por ter recusado o pedido do partido para renunciar ao mandato de deputada. Enquanto eleitora do distrito de Santarém, pergunto-me que direito tem o PCP de afastar uma deputada eleita democraticamente. Já nem falo no profissionalismo e na competência que lhe é reconhecida no exercício da sua actividade, sobretudo na área da educação.

Dizem os constitucionalistas que é ilegal, mas isso, não impediu o PCP de afastar Luísa Mesquita. Que eu saiba segundo a Constituição, «o deputado é livre de exercer o seu mandato segundo a sua consciência», sem estar dependente de qualquer organização política. No entanto, o PCP, pede aos seus deputados que assinem uma declaração, em que aceitam colocar o seu lugar à disposição se a direcção o entender. Porquê?

Subscrevo inteiramente o que se diz no blog Arrastão sobre este tema:

Um deputado pode fazer o que entender com o seu mandato. Pode votar como entender, pode obedecer ou pode desobedecer ao seu partido. Pode ficar, pode ir embora. Pode ceder o seu lugar a outro. Podemos discordar ou concordar, mas no fim é o detentor do seu mandato que decide. E responde por isso. Esta é a única garantia que temos, enquanto eleitores, que é no Parlamento que o Parlamento se decide. É pequena a garantia, mas é a que sobra. O que não é aceitável é que quem não está no Parlamento e não foi eleito pelo voto se julgue dono dos lugares dos eleitos.

Sendo eu de esquerda, entristece-me que no PCP persistam estes tiques autoritários, e quem pense diferente seja politicamente afastado, independentemente da sua competência. Não percebo porque se promove a unanimidade, a obediência cega, a ausência de debate interno. A liberdade de expressão já não é um valor fundamental para quem se diz de esquerda?

segunda-feira, novembro 27, 2006

Avalanche publicitária natalícia

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Cartoon de Plantu

domingo, novembro 26, 2006

Morreu Mário Cesariny

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Lembra-te
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Lembra-te

que todos os momentos

que nos coroaram

todas as estradas

radiosas que abrimos

irão achando sem fim

seu ansioso lugar

seu botão de florir

o horizonte

e que dessa procura

extenuante e precisa

não teremos sinal

senão o de saber

que irá por onde fomos

um para o outro

vividos
 

"O operário" Mário Cesariny, 1947


Os meus poemas preferidos de Cesariny, já postados nestes blog, aqui e aqui.

quinta-feira, novembro 23, 2006

Carrossel Dos Esquisitos

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Sou mais um no carrossel dos esquisitos
gente feia a girar
não é bonito?
juntos vamos celebrar
esta nossa palidez
que não dá p’ra disfarçar

como abutres no céu
são quase lindos
dois feiosos a rodar
gritando e rindo
são aberrações no ar
oh meu querido
fecha os olhos p’ra me beijar
que o mundo vai-se acabar




menos p’ra ti e p’ra mim
enquanto eu não te olhar
de tão perto assim
p’ra não me assustar

se uma bomba nuclear
tem a sua beleza
gente feia tem também
nem mesmo mata ninguém
que não mereça sim
morrer por ser ruim
por fazer sofrer
quem me quer assim

sobramos só nós dois
ninguém p’ra comparar
o nosso bolo de arroz
com champanhe e caviar

"Carrossel Dos Esquisitos" - Clã
John Ulhoa e Hélder Gonçalves

Nota: Felizmente para mim, os esquisitos são mais que dois, por isso não tenho de andar no carrossel sozinha... é que não é lá muito divertido...

terça-feira, novembro 21, 2006

Selecção natural das espécies


Pela primeira vez, neste blog: a vida selvagem. Imaginem um maravilhoso e impressionante ecossistema, denominado “concurso externo de ingresso para provimento de um lugar de …”. Impressionante porque este ecossistema conseguiu subverter todo o processo de selecção natural das espécies, como nós o conhecemos. Porque na realidade de externo, não tem nada. Toda a gente sabe que assim é, no entanto a comunidade científica continua a apelidá-lo de “concurso externo de ingresso para provimento de um lugar de …”, em vez de “concurso externo de ingresso para quem já está a contrato há 3 anos…” ou se quiséssemos ser precisos: “concurso externo de ingresso para o primo do irmão do sr. presidente…”.

Assim, devidamente reconhecido pela comunidade científica, este ecossistema é habitado por pequenas espécies incautas que na sua luta pela sobrevivência, acreditam tratar-se efectivamente de um “concurso externo de ingresso para provimento de um lugar de …”. Estes espécimes chegam a deslocar-se 200, 400 km e às vezes mais, para depois verificarem que mais não são que um objecto fundamental à reprodução do próprio ecossistema.


Segundo a comunidade científica, a selecção natural não se faz, se existir uma só espécie no ecossistema, logo existe um processo claro e transparente, em que, de entre inúmeros espécimes, só o mais capaz sobrevive. Quando na realidade, só uma espécie irá tirar partido deste ecossistema e já foi seleccionada à partida.


A selecção natural no ecossistema “concurso externo de ingresso para provimento de um lugar de …” é uma farsa a que toda a comunidade científica assiste impávida e serena. Deixemos a hipocrisia imperar e continuemos a brincar com a vida dos espécimes que alimentam este ecossistema.

domingo, novembro 19, 2006

sábado, novembro 18, 2006

Acabei de adoptar um gatinho!

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Nas minhas navegações pela net, descobri que se podem ter animais de estimação num blog, site pessoal ou myspace. O que é que isso tem de útil? Nada! Ajuda alguma organização de defesa dos animais? Não! Incentiva as pessoas a adoptar um animalzinho a sério? Talvez! Leva a um aumento do sentimento de respeito pelos animais e ao fim dos maus tratos e abandonos? Sem dúvida! Sem dúvida, este é o argumento que eu dou a mim própria para ter aqui o gatinho. Não é por ele brincar, saltar do cesto, comer, abanar a patinha... Não é por ser mesmo queridinho e muito, muito giro! Não que isso era muito de gaja, aqui não, estamos sempre a pensar num mundo melhor... e também temos consciência social!

E sem mais conversa inócua e vazia, eis a criatura em questão, o Dreamer:



adopt your own virtual pet!



Ele vai ficar hospedado neste blog, para já neste post, depois ficará na barra lateral. Qualquer visitante pode ir lá brincar com ele, basta andar com o rato à volta dele. Se clicarem em "more", podem até dar-lhe de comer. Isto pressupõe que venham cá todos os dias, para o bichinho não morrer de fome... ;)

quarta-feira, novembro 15, 2006

Capricórnio a seus pés

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A noite transforma os sons, os gestos e as palavras. Os sons que pontilham aquilo que ouço seriam iguais, aos que durante o dia, se misturam uns com os outros. No entanto, aqui, são únicos e nocturnos. Os gestos são únicos e nocturnos. Quase em silêncio, digo: amor. Diante de mim essa palavra existe durante muito tempo na noite, entre os sons, entre os gestos. Existo eu e existem as paredes da casa. A solidão. Reflectida pelo espelho, começo a despir-me. (...) No espelho, a minha barriga, o meu peito e os meus ombros são como estivessem em carne viva. Tu nunca saberás que sou um monstro. A ternura e o desejo não são suficientes para vencer aquilo que é invencível.

Como o veneno, como Capricórnio, como o Inverno, suporto o segredo do que descubro sozinha. A pele do meu peito transparente, demasiado fina, é como os meus olhos a mostrarem tudo o que escondo. Eu sou um monstro. Como o veneno, como Capricórnio, como o Inverno, o meu caminho é inevitável. Eu sou um monstro. Nunca ninguém me passará os dedos pelos ombros. Os lábios. Nunca ninguém me fará carícias nos seios. Beijos. Eu sou um monstro. No meu quarto, neste quarto, continuarei a esperar que adormeça antes de me despir. Tu continuarás longe a imaginar-me sem entender. E a noite continuará para sempre reflectida neste espelho.


José Luís Peixoto, “Capricórnio a seus pés” in Antídoto. Lisboa: Temas e debates, 2003. pp. 47-48.

Imagem: Girl before a mirror de Pablo Picasso, 1932


segunda-feira, novembro 13, 2006

"Doença de Crunch"

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Mais uma daquelas conversas mirabolantes, escutada sem querer num transporte público. Dois rapazinhos com idades entre os 10 e os 11 anos, trocam experiências dolorosas de doenças gravíssimas que já padeceram apesar da tenra idade. E notem, tratam-se de crianças num autocarro e não de senhoras reformadas na sala de espera do centro de saúde.

Um dos meninos queixa-se que uma vez levou um murro no pâncreas, e teve que ir para o hospital e teve de ser operado, mas ainda teve de ficar lá duas semanas para os médicos confirmarem se o pâncreas estava efectivamente curado. Um aparte, neste momento, eu pensei, a sorte do miúdo esta estadia no hospital ter sido pré-Correia de Campos, senão a história do pâncreas ia sair cara....

Mas adiante, que o outro rapazinho também tem uma história patológica para contar:

«Já ouviste falar na doença de Crunch? Eu tenho isso, uma das minhas pernas tem 1.8 cm a menos que a outra, mas o meu caso não é grave. Eu sei de uma menina que a perna tinha 2.8 cm a menos e ela teve de ser operada. E esticaram-lhe os ossos, só que depois ela ia andar e aquilo partiu-se tudo e ela ficou com uma perna 10 cm mais pequena que a outra».

O drama e o horror na cara do rapazinho nº1, que ele tal como eu nunca ouviu falar na doença de Crunch, doença essa que transformava o internamento por murro no pâncreas numa maleita banal e inconsequente. Já para o Correia de Campos, a perspectiva de centenas de crianças padecendo da doença de Crunch, por esse país fora a pagar taxas de internamento, deve ser uma visão agradável.

Nesta altura passou-me pela cabeça, que o rapazinho nº2, sentisse já o grave sindroma do portuga adulto “a minha doença é sempre mais grave que a tua” e como lhe falta o vocabulário médico, achou por bem, baptizar a doença com o nome do seu chocolate preferido... Mas tanta patranha inconsequente da boca de um rapazinho de 10 anos? Eu que pensava que os temas favoritos dos meninos desta idade fossem playstation e playstation...

O meu comentário:

Ainda tentei formular uma explicação psico-sociológica para este fenómeno, mas sem resultados. Tentei lembrar-me de mim naquela idade e dos meus amigos e não me recordo de alguém ter sentido necessidade de inventar doenças, para impressionar o outro. Lembro-me que inventávamos, mentíamos, usávamos a imaginação para improvisar brinquedos e brincadeiras onde eles não estavam. E quando mentíamos, e inventávamos longas historias que nada tinham de verdade, eram os nossos sonhos, os heróis, os polícias, os detectives, os ladrões, os príncipes e as princesas...
Não era certamente a doença de Crunch... É só de mim ou isto é tudo muito estranho?


sábado, novembro 11, 2006

Bye Bye Rumsfeld Bye Bye

The Daily Show with Jon Stewart


Eis uma boa notícia! Especialmente dada pelo Jon Stewart, crítico e certeiro como sempre.
Mas a condenção para este senhor, não devia ser só política...
Aliás, vejo na SicOnline que Rumsfeld foi processado por um saudita detido em Cuba e onze iraquianos detidos em Bagdade... Acho muito bem e porque não as famílias dos soldados americanos mortos no Iraque lhes seguirem o exemplo? E porque não todo o povo iraquiano? E a lista podia continuar...

sexta-feira, novembro 10, 2006

As subtilezas da verdade

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A porta da verdade estava aberta, mas só deixava passar meia pessoa de cada vez.
Assim não era possível atingir toda a verdade, porque a meia pessoa que entrava só trazia o perfil de meia verdade. E sua segunda metade voltava igualmente com o mesmo perfil.
E os meios perfis não coincidiam.

Arrebentaram a porta.
Derrubaram a porta.

Chegaram ao lugar luminoso onde a verdade esplendia seus fogos.

Era dividida em metades diferentes uma da outra.
Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era totalmente bela.
E carecia optar.
Cada um optou conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia.


Excerto de "O corpo" de Carlos Drummond de Andrade.

terça-feira, novembro 07, 2006

"Indivisibilidade"

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Yves tanguy
"Indefinite divisibility"

domingo, novembro 05, 2006

"O despertar da China": um excelente documentário

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Duas vidas. Uma jovem promissora designer de moda a quem a vida sorri e todas as oportunidades se abrem. Uma desempregada ex-operária fabril, cuja casa foi expropriada pelo governo, para quem todas as portas se fecharam.

A jovem designer movimenta-se na Xangai moderna, cosmopolita, capitalista, compra Prada e tem uma casa nos luxuosos subúrbios da cidade. A ex-operária fabril circula pelos mercados tentando comprar comida ao mais baixo preço, vive com o filho num apartamento em que ocupa uma divisão e partilha as restantes com outras famílias. Lamenta não poder pagar um explicador ao filho, a educação surge como a única saída, mas também ela custa dinheiro. Mostra ao filho a Xangai do MacDonald’s, dividem um big mac, olham as montras «Um dia vais me comprar uma destas!», tentando esconder o receio de que esse sonho nunca se venha a concretizar…

A operária fabril desempregada tenta desesperadamente encontrar um advogado que a ajude a processar o Estado e a recuperar a indemnização que lhe devem pela expropriação da casa. «Uma decisão muito arriscada» comenta o repórter. E ficamos a conhecer o que sucede aos advogados que aceitam casos destes. Foi preso, a sua casa e todos os seus bens expropriados. A sua esposa agora despojada de tudo, balbucia comovida «o meu marido não queria dinheiro, não precisava de muita coisa, mas queria ajudar as pessoas…».

E o que tem a dizer sobre isto, a jovem designer a quem a vida corre bem? Será que sabe do fosso entre ricos e pobres? Ela sabe que a China é um país totalitário, mas não pode fazer nada contra isso, admite que nunca discute política com os seus amigos. Um dos seus amigos, diz optimista que será só uma questão de tempo, até todos partilharem da mesma prosperidade.

Um país, dois sistemas? Estas histórias mostram-nos o pior dos dois sistemas. O capitalismo selvagem, as desigualdades profundas são fomentadas por um poder autoritário, repressivo, que não olha a meios para atingir os seus fins…

Adenda: Quem estiver interessado em acompanhar o documentário, poderá vê-lo na RTP 2, aos domingos às 14:00 e às segundas-feiras às 23:30. Vale a pena...

quinta-feira, novembro 02, 2006

Seriedade politica

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Cartoon de Quino gentilmente surripiado do blog "O Bico de gás"