terça-feira, abril 28, 2009

Mayday: porquê?

Aproxima-se o 1º de Maio e com ele uma manifestação chamada Mayday, especialmente dedicada ao combate do trabalho precário entre os jovens. Cada vez faz mais sentido, qualquer iniciativa que denuncie o trabalho precário , que cada vez mais se torna a regra, em vez de excepção. Todos conhecemos casos de pessoas que efectuando um trabalho de um qualquer funcionário com contrato, sao pagas a recibo verde, sem direito a férias, nem a estar doente, nem a faltar justificadamente, e sem direito a subsidio de desemprego. Recordo que se tratam de direitos laborais conquistados no séc. XIX e que são negados em pleno séc. XXI às gerações mais jovens.

Infelizmente esta realidade não é nova, o que me leva a escrever este post, é que a realidade da precaridade está a assumir contornos perfeitamente inadmissíveis. Como é do conhecimento geral, o Estado era um dos maiores empregador es de trabalhadores a recibo verde. Agora numa tentativa de moralizar o sistema (já veremos se é disso que se trata), o governo proibiu a contratação a recibo verde. A consequência tem sido um inventar de esquemas para colmatar essa situação, como tentar persuadir os trabalhadores a constituírem-se como empresas ou tão ou mais grave, recorrer a empresas de recrutamento de mão-de-obra a recibo verde.

Na prática o Estado não comete nenhuma ilegalidade, os precários continuam a trabalhar a recibo verde, com a escandalosa agravante de serem explorados por uma segunda entidade, que irá obter lucros dessa posição porque cobra ao Estado, que não paga directamente aos funcionários. Já tinha ouvido rumores que isto estava a acontecer, mas não tinha lido sobre casos concretos até aqui. O blog “Precários inflexíveis” denuncia a estranha relação da Câmara Municipal de Caldas da Rainha e a empresa ESContact Center que passo a citar:

«A ES Contact Center irá gozar de um investimento de 700 mil euros da câmara municipal das Caldas da Rainha. Segundo uma notícia recente do DN, a ES Contact Center mencionou epistolarmente a possibilidade de procurar outras paragens caso a autarquia recusasse embarcar nesta ajuda. Importa aqui referir que o administrador delegado da ES Contact Center é Pedro Champalimaud, presidente da Associação Portuguesa de Contact Centers (APCC), pelo que a ameaça de deslocalização assume uma gravidade acrescida. Mas está tudo bem, a ameaça não se concretizará.

Afinal, a mesma ES Contact Center que agora vem pedir patrocínio aos contribuintes das Caldas da Rainha e de todo o país foi considerada há um ano a empresa do ano em 2007, recebendo um prémio da própria Câmara Municipal das Caldas da Rainha. E Pedro Champalimaud recebeu do sector o prémio individualidade do ano em Dezembro, pelo seu trabalho à frente da ESContact Center e da APCC. Por isso, há que mantê-los nas Caldas da Rainha a todo custo, não é? Terá sido o que pensou o Presidente da autarquia, Fernando Costa (PSD), que fez aprovar o negócio há dias em assembleia municipal. Argumenta o Presidente que estes 700 mil euros representam a garantia de mais “300 a 350postos de trabalho” no concelho e "150 mil euros de ordenados por mês".

E ficaria também bem perguntar aos responsáveis da RTP, do Turismo de Portugal, do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana e do Instituto Português da Juventude – todos clientes ilustres da ES Contact Center - se estão dispostos a assumir uma posição clara contra esta extorsão de dinheiro dos contribuintes e acima de tudo contra a precariedade e exploração dos trabalhadores do call center.»

É esta a novidade que nos deve indignar profundamente. Há quem consiga lucrar com a exploração laboral que já era dramática sem intermediários sem escrúpulos. É incrível a falta de ética, que é induzida pelo próprio Estado, cujo objectivo é camuflar a realidade do trabalho precário no sector público. A precariedade aumenta e os direitos laborais conquistados no sec.XIX ficam cada mais longe, a não ser que iniciativas como o Mayday venham alertar para a necessidade de os reconquistar.

domingo, abril 26, 2009

Para todas as jovens almas censuradas



José Mário Branco "Queixa das jovens almas censuradas"

Dedicado a todas as jovens almas censuradas, as de ontem e as de hoje...

sábado, abril 25, 2009

Por ser 25 de Abril...

Por ser 25 de Abril, vou fazer uma reflexão e não um lamento. Já todos temos a noção que a liberdade e o regime democrático não trouxe as mesmas liberdades, direitos e garantias para todos. Já percebemos que por mais que trabalhem ou por mais mérito que tenham, vastas camadas da população estão irremediavelmente excluídas de posições de poder, político ou económico. Vale a pena pensar porque isto acontece. Não será um problema profundo de mentalidade colectiva? Até que ponto temos noção do que é realmente o bem comum e percebemos o conceito de cidadania?

Porque é que até as pessoas mais idealistas, em posição de poder, seja no sector privado seja no público, se perceberem que podem tirar benefício próprio da função que têm, apropriam-se do que podem. Abdicam de qualquer ideal ético ou moral e delapidam o bem público, sem se preocupar com as consequências que daí advêm para todos. Assim surgem as desigualdades escandalosas de salários milionários, prémios de produtividade, chorudas reformas para uns e para outros nem um emprego, ou um salário que garanta condições mínimas de dignidade. Sendo que isto, num país que não é rico estrangula as possibilidades dos que não estão em posição de poder. Neste momento, a maioria da população tem apenas liberdade para lutar por níveis mínimos de sobrevivência, a mobilidade social ou económica está-lhes vedada. As portas que Abril abriu estão há muito fechadas para essa extensa maioria.

Estou a lembrar-me de uma reportagem que passou na SIC uns dias atrás, sobre a liberdade. Entrevistavam-se estrangeiros que vivem em Portugal, para saber o que pensavam desse conceito visto pelos portugueses. Chamou-me a atenção uma senhora inglesa que disse que em Portugal, não existe essa mobilidade social, que referi há pouco. Um outro entrevistado, falou na nossa persistência em confundir competência com chico-espertismo. É esse chico-espertismo que leva a ética e a noção de bem comum, seja substituída pelo enriquecimento individual a qualquer custo.

Os ideais de Abril só poderão imperar, quando o sistema económico e social sofrer uma espécie de moralização, que tem que começar pelas pessoas em cargos de poder. É uma transformação das mentalidades que só terá lugar, quando determinados abusos de posição dominante forem impedidos e com uma forte aposta na educação e na cultura cívica. Está nas mãos do poder político moralizar o sistema e transformar mentalidades. Se os cidadãos perceberem que essa vontade política existe, também se habituarão a pensar no bem comum, como parte fundamental do seu bem individual e talvez aí o nosso profundo problema de mentalidade colectiva seja atenuado.

quinta-feira, abril 23, 2009

Preocupante ou talvez não

Regressada à normalidade técnica (sim, o portátil é vivo), só o cansaço e o trabalho me impedem de actualizar o blog. No último post, fiquei de aprofundar porque me indignou o aumento das custas judiciais. Num contexto de crise económica e desemprego, tem um enorme peso na decisão do cidadão recorrer à justiça, sabendo que à cabeça terá que pagar metade do custo total do processo. Ainda por cima, um cidadão que sabe o tempo que os processos se arrastam, e que consegue apontar n casos, em que as responsabilidades nunca foram apuradas e portanto já está descrente da eficácia desse esforço financeiro. Só irá fazer esse esforço, quem tenha um poder económico considerável para contratar um advogado de renome ou quem ache que consegue mover influências.

O que torna tudo isto procupante, é que a justiça é um garante do sistema democrático. A pensar nesta questão, lembrei-me de um post do Devaneios Desintéricos e como alguém já tinha exposto esta preocupação claramente há um ano atrás:

«O acesso à Justiça é um dos melhores indicadores da salubridade democrática de um Estado. Não é, pois, por acaso que quase todas as Constituições dos países livres dedicam algumas linhas dos respectivos elencos de direitos, liberdades e garantias a assegurarem que a nenhum cidadão poderá ser negado o acesso à Justiça em resultado das suas insuficiências económicas.»

Na altura o tema era a Portaria nº10/2008, que na prática limitava o acesso aos advogados oficiosos e assim vedava o acesso à justiça dos cidadãos com dificuldades económicas. E se esse facto já era preocupante e discriminatório, é agora agravado. A discriminação de quem tem carências económicas é evidente e no entanto envolve um silêncio ensurdecedor.

Será que se tornou tão banal e expectável, que já não merece a nossa atenção?


segunda-feira, abril 20, 2009

Não, este blog não foi abandonado...

Ao contrário do que possa parecer, este blog não foi abandonado. Está a ser negligenciado por motivos técnicos, o portátil da blogger resolveu falecer. E está nesta altura nas mãos de um especialista que nem olhou para ele ainda... O que faz deste momento uma excelente altura para falar da actualidade, porque a minha raiva está direccionada para a tecnologia no geral e para os técnicos de informática em particular. É lamentável, porque eu até tinha várias críticas a fazer., facto agravado pela ausência de tempo para isso claro, porque fica mal estar no pc do trabalho a escrever longos posts...

Vou abreviar as críticas que tinha a fazer, sendo que alterei a minha ordem de prioridades. A sociedade de consumo e a "produção de material de duração inferior a 3 anos, para que depois se compre outro novo" está a conseguir irritar-me mais que o Socrátes, o que, sabe quem me lê, não é nada fácil. Estamos a falar do homem que escolhe Durão Barroso, o pagem da cimeira das Lages para Presidente da Comissão Europeia. E é também o tipo, que está a impedir o acesso já de si díficil dos cidadãos à justiça, pelo aumento das custas judiciais, num país em que os familiares das vítimas da queda de uma infra-estrutura do Estado acabam a pagar as custas judiciais desse mesmo processo. Se o panorama era lindo, ficou melhor.

E deixem-me que vos diga, este raciocínio já provocou o realinhamento das minhas prioridades... e o desenvolvimento desta ideia ficará para quando o meu portátil regressar do mundo dos mortos, se resolver regressar...

terça-feira, abril 14, 2009

Chegados a este ponto...

Na mesma altura em que milhares de pessoas se inscrevem nos centros de emprego, uma pequena elite de gestores de topo da GALP e da BRISA recebem prémios chorudos de produtividade. Tem piada que uma empresa que faz lucros milionários à conta de um mercado que o Estado privatizou e desregularizou, venha premiar os seus gestores. Deve ser preciso ser mesmo talentoso e competente para gerir de forma lucrativa uma situação de monopólio. O que interessa as consequências para os consumidores e para a economia em geral?

E que tal coragem para dizer que a crise é para todos e logo não há prémios milionários? Até o Obama fez isso com a AIG. Vamos ver até quando se pode manter esta desigualdade de direitos. Será até ao ponto das crianças chegarem subnutridas aos hospitais ou às escolas? É que esse ponto já chegou....

domingo, abril 12, 2009

Acabei o fim-de-semana com...

Um Concerto assim:



Deolinda "Movimento Perpétuo Associativo"

A letra explica muito, não explica?

quarta-feira, abril 08, 2009

Berlusconi again...

Normalmente as tragédias suscitam reacções unânimes de pesar e entreajuda, mas não com Berlusconi. Este governante detestável nem nestas situações consegue esconder o seu calculismo e insensibilidade. Ao que parece a experiência traumática da vivência de um sismo, a perda da casa, a morte de conhecidos e familiares é o comparável a um fim-de-semana no campismo. Que divertido! Nem se percebe porque é o Primeiro-Ministro italiano não se juntou à festa. Ao que parece, não vai visitar pessoalmente as zonas mais atingidas da cidade de Aquila. Não se percebe porquê, podia tocar viola à fogueira e comer marshmallows…

terça-feira, abril 07, 2009

Será que caí de vez?


Cartoon de Dario Castillejos

domingo, abril 05, 2009

Esperança segundo Harvey Milk

A semana passada recebi um telefonema.
De Altoona, Pensylvania.
A voz era de alguém muito novo.
E a pessoa disse: 'Obrigado'.
É preciso eleger gays.
Para que milhares
de crianças como esta,
saibam que existe
esperança numa vida melhor.
Esperança
num futuro melhor.

Eu só peço isto:
Se me assassinarem.
Peço uma mobilização
de cinco, dez, cem, mil pessoas.
E se uma bala entrar
no meu cérebro
que destrua cada
porta fechada.
Peço que continuem
com o movimento.
Porque não se trata
de um jogo pessoal.
Não se trata de ego.
Não se trata de poder.

Trata-se sim, daqueles como nós
espalhados pelo mundo.
Não apenas os gays.
Mas os negros, os asiáticos,
os idosos, os deficientes. 'Nós'.
Sem esperança,
'nós' desistimos.
Eu sei que não podemos ter
esperança quando estamos sozinhos,
mas sem esperança,
não vale a pena viver.

Por isso, você...
e você, e você.
Têm que os fazer acreditar.
Têm que os fazer acreditar.

Excerto do filme "Milk" de Gus Van Sant (2008)

quarta-feira, abril 01, 2009

Caso práctico

Já escrevi muitos posts sobre a recessão e sobre a necessidade de re-inventar um sistema económico e social mais justo e igualitário. A maior parte das vezes mais em teoria do que na prática, e por prática, refiro-me ao impacto que o neoliberalismo tem na vida concreta das pessoas. Por isso vou partilhar neste post, a situação dramática que se vive numa empresa perto de mim, que podia ser qualquer uma outra noutro ponto do país.

Os trabalhadores não recebem salários desde Novembro do ano passado. Pode-se imaginar o drama das pessoas, muitas da mesma família a trabalhar no mesmo local. Resolveram fazer um protesto à porta da empresa e parar a laboração. Foi então que lhes foi "sugerido" que levassem o seu protesto à Câmara Municipal. Aparentemente a culpa dos salários em atraso é de uns 200 mil euros que ainda não foram pagos. Seria suposto acreditar que a empresa não teria outras fontes de receita? A estratégia era essa...

Conscientes ou não da manipulação subliminar ou porque não existia alternativa, os trabalhadores acederam a levar o protesto para outro lado. E lá foram para a praça do município, onde já estavam mais polícias que trabalhadores. E lá foram recebidos pelo Presidente da Câmara que acedeu a dar um aval ao tal pagamento...

Um final feliz? Para o empresário sim, recebeu uma dívida que nunca receberia sem esta pressão dos trabalhadores, com um bando de jornalistas locais atrás, diga-se... E os salários em atraso continuam sem ser pagos, enquanto outros bens foram adquiridos e rapidamente colocados em nome de esposas e netos...

Ao ponto que chega a mesquinhez e a manipulação... usar a dignidade dos trabalhadores em proveito próprio, desta forma? É o capitalismo selvagem no seu melhor, sem regulação e aos desprotegidos, sem defesa, nem a dignidade resta...