quinta-feira, outubro 27, 2011

A Pequena China da Europa

A expressão é de Pedro Lains referindo-se ao impacto no país, das medidas previstas no orçamento para 2012. A explicação é simples o governo não está preocupado com a redução do défice, mas sim com a alteração do modelo socioeconómico do país, impondo um novo modelo baseado nos baixos custos do trabalho, desvalorização salarial para ganhar competitividade.

«O plano de Vítor Gaspar já chocou muita gente, porque é chocante. E não o fez só à esquerda, pois o PSD também ficou chocado e muito. Mas não se consegue mexer. Nem o PS. A principal razão porque o plano é chocante é que ele assenta numa carta que não estava no baralho: a contracção sem limites de salários - e mais aumento de impostos. Assim qualquer um sabe governar.»

Escola de Milton Friedman que Vítor Gaspar frequenta
Como eu própria já referi antes, trata-se de uma obsessão ideológica, que ultrapassa o que a própria troika determinou e estende no tempo as medidas recessivas. Só assim se percebe a suspensão de 2 meses de salários a funcionários públicos e pensionistas, o aumento em meia hora do dia de trabalho, a carga fiscal esmagadora para quem trabalha por conta de outrem, expropriação dos bens do Estado através de privatizações e a redução dos serviços públicos ao mínimo. Acredita-se piamente que uma economia baseada em baixos salários, intervenção mínima do Estado, relações laborais precárias e expropriação dos bens do Estado é garante de desenvolvimento.

É muito fácil perceber que nada disto garante desenvolvimento, só recessão e destruição da nossa economia. Se reduzimos massivamente o rendimento das pessoas, destruímos o mercado interno, com menos lucros fecha o comercio e as pequenas empresas, o que gera desemprego que por sua vez gera quebra de receitas em impostos para o Estado, enquanto aumenta as despesas com a segurança social. Não devemos esquecer o impacto da pobreza no aumento da criminalidade, nos problemas familiares e sociais que têm reflexo na saúde, na educação e no recurso ao rendimento social de inserção, ou seja aumenta a despesa do Estado. Qualquer pessoa percebe isto.

E o que dizer da meia hora a mais? É muito simples, vai atirar pessoas para o desemprego ou impedir a contratação de outras, num país que precisa urgentemente de resolver o problema da taxa de desemprego elevada. Por outro lado, não convém esquecer o impacto na vida familiar e no bem-estar social. E as privatizações de sectores estratégicos fundamentais e que até dão lucro? Basta olhar para o que aconteceu na Grécia, o contexto desfavorável, fez com que fosse tudo vendido ao desbarato e em vez de 66 milhões obtiveram-se 10! Para além de que, investidores estrangeiros nunca irão garantir a salvaguarda do interesse nacional, somente o que for lucrativo para os próprios. Já nem falo das consequências de serviços públicos mínimos, porque são óbvias, quem é rico paga, quem é pobre sobrevive com caridadezinha ou morre.

E o fundamento do Governo para estas medidas é simples e falso. Não precisamos de mercado interno, vamos crescer pelas exportações e com o financiamento estrangeiro. Falso, as economias estrangeiras estão também em dificuldades e as que não estão, retraem-se. Temos que ter estas politica de austeridade para acalmar os mercados. Falso, o impacto recessivo será tal que impede a economia de crescer e isso recebe nota negativa dos mercados (basta recordar que no mesmo dia em que foram anunciadas as primeiras medidas, o rating desceu para lixo...). Se tentarmos renegociar a divida, não seremos sérios e não podemos voltar aos mercados. Falso, um país com uma economia destruída é que nunca terá benesses dos mercados, se se permite que a Grécia tenha um perdão da divida, temos toda a legitimidade para negociar. Não há alternativas para reduzir o défice. Falso, que tal taxar o grande capital e impedir a fuga para offshores, a mudança de morada fiscal das nossas maiores empresas e taxar as transacções financeiras (há mais mas o post está grande, fica para o próximo). Resumindo: sentença de morte para o país em nome de mitos ideológicos que nunca foram concretizados com sucesso, em parte nenhuma! É de apoiar bovinamente...

quarta-feira, outubro 19, 2011

Balanço tardio

Não consegui fazer antes uma apreciação da manifestação do passado sábado, mas acho que vale a pena fazê-lo quando tantas criticas se levantam. Pessoalmente fiquei satisfeita com a manifestação em Lisboa, talvez porque as minhas expectativas fossem baixas. Nunca a propaganda mediática do apelo ao conformismo e às inevitabilidades foi tão grande e isso afastou muita gente da rua. Lamentei não ver os outros 100 mil que em 12 de Março encontraram razões de descontentamento e não conseguiram ver que hoje as razões triplicaram...

Gostei muito de assistir à Assembleia Popular, é uma lufada de ar fresco face aos comentadores televisivos, e se algumas declarações foram mais populistas ou exageradas, na maioria foram interessantes. Recusou-se a dívida, apontaram-se culpados (houve quem falasse das parcerias publico-privadas e das empresas que delas beneficiam), exigiu-se uma auditoria à dívida e discutiu-se a banca e a forma como recebe dinheiro do BCE a juros de 1% e empresta ao Estado a 6%. No entanto, basta duas ou três pessoas se insurgirem com o sistema partidário, para logo se erguerem vozes alarmistas falando em movimentos perigosos e irresponsáveis. Curiosamente são as pessoas dos partidos que não cumpriram programas eleitorais e que têm vindo a desiludir os cidadãos, portanto não me chocam esses discursos, nem que as pessoas prefiram uma democracia directa e soluções semelhantes à islandesa.

Por outro lado, também não me choca ver gente dos partidos na manifestação dos Indignados, porque nem todas são responsáveis por estas medidas e este estado de coisas. Nunca me agradou que se diga que os políticos são todos iguais, porque não são. Estou a falar dos dois lados da barricada, por uma razão muito simples. Quando o inimigo é altamente destruidor e poderoso, as diferenças devem colocar-se de parte para que a união de esforços vença o mal pior.

domingo, outubro 16, 2011

sexta-feira, outubro 14, 2011

Não seja urso!


O Metro de Lisboa lançou uma campanha muito engraçada, subordinada ao tema “Não sejas Urso!”. Parece-me muito bem, porque efectivamente este é um país de ursos. Não só porque não sabem normas básicas de boa educação e civismo (impedem a passagem a quem quer sair do metro, ouvem música alta sem phones e colocam as patinhas em cima dos bancos) mas também porque optam deliberadamente por alhear-se da realidade, não se informam, não pensam, não questionam, não actuam. A consequência é que um país de ursos elege um governo de ursos, os mais ursos dos ursos. Quando os maiores dos ursos explicaram que iam para além do acordo da troika, os outros ursos não quiseram ouvir ou não quiseram pensar nas implicações que isso teria, até porque como ursos que são nunca quiseram saber o que estava no referido acordo. Como não quiseram saber, os ursos elegeram aqueles que os vão condenar à miséria, que vão arruinar o futuro dos seus filhos e em última instancia condenar o seu país a uma recessão contínua. Por isso agora, ficam surpreendidos quando lhes roubam meses de salários, os obrigam a trabalhar mais dias e horas, os sobrecarregam de impostos, enquanto lhes tiram o direito à saude, à educação e ao apoio social. Como são mesmo ursos, acreditam que tudo isto é inevitável e passageiro, porque os maiores dos ursos garantem que é solução e que os sacrificios são para todos.

Os ursos perdem rendimento enquanto os amigos dos maiores ursos recebem 3 ou 4 fortunas milionarias e vêm para a TV, explicar aos ursos miseraveis que andaram a viver acima das suas possibilidades e como tal têm que pagar a factura. Os ursos aceitam pagar muito mais imposto pelo rendimento do trabalho, enquanto quem ganha dinheiro com acções não paga um centimo, enquanto vêm fugir 8 mil milhoes de euros para offshores todas as semanas. Os ursos que pagam impostos não se importam que outros não o façam. Não se importam que os bancos não paguem o imposto devido, nem que não exista aumento de IRC para as grandes empresas deste país, que têm lucros de 20% mesmo em recessão. Os ursos aceitam sacrificios para pagar uma dívida que não é da sua responsabilidade, não exigem que sejam culpabilizados os governantes que negociaram parcerias público-privadas ruinosas, que deixaram o urso da Madeira esbanjar dinheiro sem prestar contas, que colocaram os seus amigos à frente de um BPN que só provocou um buraco de 2.400 milhões de euros.

São coisas que não interessam aos ursos, até porque resolveram votar nos mesmos ursos responsáveis por essas negociatas. São os mesmos ursos maiores que geriram de forma incompetente as empresas de transportes públicos e que agora exigem aos ursos que paguem a factura nos seus passes e nas suas deslocações para o trabalho. Isto para os ursos que ainda têm trabalho para onde ir, porque agora podem ser despedidos por qualquer motivo, especialmente pelo simples facto de existirem como ursos. Não incomoda os ursos pagar mais na factura da electricidade, do gás e afins, quando a EDP e a GALP tem milhões de lucro. Não assiste aos ursos, indignarem-se com as privatizações ao desbarato de empresas pagas com os seus impostos e dos seus pais e avós ursos, empresas que dão lucro e que podiam permitir ao Estado para a tal dita dívida e proporcionar a sustentação saúde e educação aos filhos dos ursos.

Os ursos acham que não se pode fazer nada, é inevitavel, não há alternativa porque nunca se informaram do que tem acontecido nos paises onde entra o FMI. Ignoram que a receita da austeridade não funcionou em lado algum! Dizem-lhes que os gregos estão mal porque não seguiram a receita, quando foi a receita que os arruinou. Agora até a taxa de suiscidios aumentou 40%. Mas os ursos acham que acham que são diferentes, assobiam para o lado e nada disto é com eles. Está uma manifestação global marcada para amanhã às 15h. é a altura dos ursos deixarem de o ser e exigirem uma mudança. Usa a única arma que tens, vem para a rua fazer ouvir a tua voz:

“NÃO SEJA URSO!”

terça-feira, outubro 11, 2011

Uma declaração de todos e para todos

Todos já percebemos que vivemos tempos difíceis e inquietantes. Conhecemos a pobreza e a angústia. Sabemos que o sistema actual perdeu a sua essência democrática e lamentamo-nos. No entanto, muitos de nós acham que isso é inevitável e que não há nada que se possa fazer. Eu não quero acreditar nisso e as pessoas que protestam nas ruas de Nova Iorque também não. Podemos exigir mudanças e politicas alternativas. Esta declaração é a prova disso. Resolvi martelar uma tradução, porque é fundamental que seja lida e percebida. Existem soluções para problemas comuns, há esperança, ou agimos agora ou não agimos de todo. No dia 15 de Outubro podemos agir e responder ao apelo vindo de Nova Iorque. Aqui fica a "tradução" do apelo (o destaque a bold é meu):

Declaração do Movimento Ocupar Nova Iorque

Este documento foi aprovado pela Assembleia Geral de Nova Iorque a 29 de Setembro de 2011


Enquanto nos juntamos em solidariedade para expressar um sentimento de injustiça maciça, não podemos perder de vista o que nos aproximou. Escrevemos para que todas as pessoas que se sentem enganadas pelas forças corporativas mundiais, possam saber que somos suas aliadas. Como um povo, unido, compreendemos a realidade: que o futuro da raça humana exige a cooperação de todos os seus membros; que o nosso sistema deve proteger os nossos direitos e perante a corrupção desse sistema, cabe aos indivíduos proteger os seus próprios direitos e aqueles dos que lhes são próximos; que um governo democrático recebe o seu justo poder do povo, mas as corporações não pedem autorização para extrair a riqueza do povo e do planeta; e que nenhuma democracia se alcança quando o processo é determinado pelo poder económico.

Chegamos a uma altura em que as corporações, que colocam o lucro acima das pessoas, o interesse próprio acima da justiça, a opressão acima da igualdade, controlam os nossos governos. Formamos pacificamente uma assembleia aqui, sendo um direito nosso, para dar a conhecer estes factos. Eles levaram as nossas casas através de um processo ilegal de expropriação, apesar de não terem o documento original da hipoteca. Receberam “resgates” dos contribuintes com impunidade e continuam a premiar com chorudos bónus os seus Gestores executivos. Perpetuaram a desigualdade e a discriminação no local de trabalho baseada na idade, cor da pele, sexo, género e identidade sexual. Envenenaram o fornecimento alimentar de forma negligente e destruíram o sistema agrícola através da criação de monopólios. Lucraram com a tortura, o encarceramento e o tratamento cruel de inúmeros animais e esconderam activamente essas práticas.

Tentaram continuadamente retirar aos trabalhadores o direito a negociar melhores salários e condições de trabalho mais seguras. Mantiveram os estudantes reféns com dezenas de milhares de dólares de divida pela sua educação, que é em si mesma um direito humano. Utilizaram de forma consistente o trabalho em regime de outsourcing, como forma de diminuir o salário e os direitos sociais dos seus trabalhadores. Influenciaram os tribunais, para conseguirem os mesmos direitos que as pessoas, sem qualquer responsabilidade ou culpabilização. Gastaram milhões de dólares em equipas de juristas que procuram estratégias, para os dispensar do cumprimento de cláusulas legais contratuais, em termos de seguros de saúde. Venderam a nossa privacidade como se se tratasse de um luxo.

Usaram as forças policiais e o exército para impedir a liberdade de imprensa. Recusaram deliberadamente retirar produtos fraudulentos, colocando vidas em risco, somente para perseguir o lucro. Determinam a politica económica, apesar dos falhanços catastróficos que essas politicam produziram e continuam a produzir. Doaram largas somas de dinheiro aos políticos, que eram responsáveis pela sua regulação. Continuam a bloquear formas de energia alternativa para nos manter dependentes do petróleo. Continuam a bloquear tipos genéricos de medicamentos que poderiam salvar a vida das pessoas ou fornecer algum alívio, para proteger investimentos que proporcionam um lucro substancial. De forma propositada, esconderam derrames de petróleo, acidentes, contabilidade fraudulenta, nessa persecução do lucro. Propositadamente mantiveram as pessoas desinformadas e assustadas, através do controlo que exercem sobre os média. Aceitaram contratos privados para assassinar prisioneiros, mesmo quando foram levantadas sérias dúvidas quanto à sua culpa. Perpetuaram o colonialismo dentro e fora de portas. Participaram na tortura e no assassinato de civis inocentes no exterior. Continuam a criar armas de destruição maciça para receber contratos do governo.


*Aos cidadãos do mundo, Nós, a Assembleia Geral de Nova Iorque que ocupa Wall Street em Liberty Square, encorajamos-vos a afirmar o vosso poder. Exerçam o vosso direito à assembleia pacifica, a ocupar o espaço publico, a criar um processo que responda aos problemas que enfrentamos e que gerem soluções acessíveis a todos. A todas as comunidades que resolvam agir e formar grupos no espírito da democracia directa, oferecemos apoio, documentação e todos os recursos à nossa disposição. Juntem-se a nós e façam ouvir a vossa voz!*

segunda-feira, outubro 10, 2011