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quinta-feira, dezembro 22, 2011

Misiticação

mistificar
(francês mystifier)
v. tr.
Abusar da credulidade de alguém. = ENGANAR, LOGRAR


O actual governo mistifica, adora mistificar e julgo poder dizer com certeza que mistifica com sucesso. Senão vejamos, uma pequena amostragem:
O Ministro da Saúde aumenta as taxas moderadoras em 163% (ai se todos os salários aumentassem nessa percentagem…) e justifica a medida dizendo que os ricos devem pagar mais, ou fazendo cálculos estranhos que mostram que cada cidadão não isento pagará mais 3 euros por mês pela utilização do SNS.
  • Mistificação 1: os ricos vão ao hospital privado;
  • Mistificação 2: como o cálculo da isenção nem contempla o nº de pessoas no agregado familiar, um casal, duas reformas de 320€ paga taxa moderadora, um casal com filho e 2 salários mínimos paga taxa moderadora… gente rica? Pois claro… se tiverem o usar de adoecer no mesmo mês, esta família poderá gastar metade de um salário entre taxas e pagamento de exames.
  • Mistificação 3: Não se pode dizer que um aumento de 163% é insignificante, dividindo o valor que se espera arrecadar pelos possíveis utilizadores do SNS. A distribuição jamais será igual, uns precisarão mais do SNS que outros e dificilmente a periodicidade será mensal, é um cálculo completamente enganador.
Vem o Sr. Ministro da Economia, dizer que vão reduzir o valor das indemnizações para que se aproxime da média europeia. 
  • Mistificação: Nunca se usa a convergência europeia para aproximar valores efectivos dos salários, os portugueses poderiam ter 20 anos de salários que nunca chegariam ao valor de indemnização que recebe um alemão por meia dúzia de anos. 
Vem dizer que temos de trabalhar mais horas, mais dias, perdendo férias e feriados, porque isso resolve o problema da produtividade. 
  • Mistificação 1: os problemas de produtividade devem-se a más técnicas de organização e gestão empresarial e o grande encargo para as empresas, são os custos de produção com a energia, electricidade e combustíveis. 
  • Mistificação 2: Se virmos o calendário de feriados dos outros países e o nº de dias de férias, não há diferenças significativas, já para não falar que os dias de descanso existem, porque pessoas esgotadas não são produtivas. 
  • Mistificação 3: O objectivo não é resolver o problema da produtividade, é tornar o país competitivo pelos salários miseráveis e horário elevado de trabalho, despojando os cidadãos de qualquer direito para passarem a um regime de semi-escravatura, podendo ser dispensado a qualquer momento. Sendo que até esta crença absoluta é também uma mistificação, porque por muito baixos que sejam os nossos salários, haverá sempre a China e a Índia, nunca se obterá competitividade por aí.
Toda e qualquer medida dura para os cidadãos, é justificada com o memorando da troika. 
  • Mistificação 1: Está-se a ir para além do memorando. No caso da saúde o que está lá é o valor do orçamento a reduzir, não obriga a estas opções, podia-se melhorar a gestão hospitalar e acabar com as parceiras publico-privadas que se reduzia muito mais o orçamento na saúde. No caso do trabalho, o memorando não fala em lado algum em trabalho não remunerado. 
  • Mistificação 2: O acordo da Troika não é para cumprir quando exigia a renegociação de todas as parecerias publico-privadas. Nesse domínio não se fez nada, não se poupou um cêntimo, porque teria de se afrontar certos interesses económicos que são a base de apoio do governo.
Podia continuar a enumerar mistificações, mas para não alongar o texto para já ficamos por aqui. O que foi indicado já demonstra como se abusa da credulidade de alguém. Mistifica-se. E disse eu, com sucesso! Porquê? Porque este governo ainda está em funções, mesmo mandando classes socioprofissionais completas, emigrar. As pessoas não percebem o logro. Aceitam até a total admissão de incapacidade governativa. Se não existisse mistificação, qualquer cidadão consciente iria exigir a demissão do governo.

quarta-feira, dezembro 14, 2011

A culpa não é nossa, é dele!


Este país é realmente caricato. Os cidadãos portugueses nunca foram tão agressivamente atacados nos seus direitos em democracia, e devia ser evidente para todos quem são os protagonistas dessa agressão. Mas como existe um governo com uma agenda manipuladora e com a cumplicidade da comunicação social, as evidencias deixam de o ser. O bode expiatório é José Sócrates, o malandro das costas larguíssimas! O governo de Passos Coelho não é responsável pelas medidas que toma, a culpa é de quem governou nos anos anteriores. Não é quem decidiu ir para além da troika, não é quem tem a sensibilidade social de uma pedra, não é de quem quer extinguir o estado social e os serviços públicos, é daquele malandro do Sócrates. Faço já aqui a devida ressalva, que não gosto do senhor e muito menos das medidas que tomou e basta ir ler o que escrevi neste blog na altura. Agora responsabilizá-lo por uma situação económica dramática cujas causas vêm sobretudo do tempo de Cavaco Silva e por uma conjuntura internacional que lhe é alheia, é ridículo. Vou até citar o Daniel Oliveira, que gosta tanto do senhor Sócrates como eu, mas que explica muito bem o que está em causa, vale a pena ler o artigo todo, mas destaco o seguinte:

«É fácil acreditar na ideia de que a nossa situação atual se deve a um homem. Mesmo que tudo nos demonstre o absurdo de tese. Sócrates não conseguiu, apesar de tudo, governar Portugal, a Grécia, a Irlanda, Itália e a Espanha em simultâneo. E mesmo os nossos problemas - dívida externa, desigualdade na distribuição de rendimentos, crescimento cronicamente baixo, desequilíbrio da balança de pagamentos, uma moeda demasiado forte, distorções no mercado de arrendamento, falta de competitividade da nossa produção, erros crassos no nosso modelo de desenvolvimento - não têm seis anos. Só que resumir tudo à dívida pública e a um homem dispensam-nos de qualquer reflexão mais profunda. Há um culpado e a coisa está feita. E tem outra utilidade: sendo a culpa do primeiro-ministro anterior só nos resta aceitar tudo o que seja decidido agora. Afinal de contas, Passos Coelho está apenas a resolver os problemas deixados pelo seu antecessor.»

O mais grave de tudo isto é de facto a manipulação, é uma estratégia para levar as pessoas a interiorizar o inevitável, o não há alternativa e com isso justificar uma determinada agenda politica que qualquer cidadão consciente jamais poderia aceitar. Infelizmente a estratégia resulta, não se fala do aumento brutal das taxas moderadoras, dos transportes, das scuts, nem da cimeira europeia, fala-se sim daquele malandro que diz que as dívidas gerem-se. É um facto óbvio, até porque num contexto económico adverso um país pode ter que se endividar mais, para evitar a recessão e o colapso social, e depois reduzir essa divida num momento de retoma económica. É por isso que os governos têm liberdade de gerir a sua politica orçamental de acordo com a conjuntura. O que me leva ao grave problema que tem sido secundarizado pela questão Sócrates. A ultima cimeira determinou que os países perdem a liberdade de gerir a sua politica orçamental e no fundo a sua economia, independentemente da conjuntura. Pessoas que não elegemos condenam-nos a uma «austeridade forever» e a politicas que servem exclusivamente os interesses da Alemanha. Colocando a coisa de forma simples, podia acorrer um cataclismo, a total penúria, um novo terramoto de 1755 que o défice teria de ser 0,5… insensato, ridículo e sobretudo uma afronta à soberania nacional e à democracia. Obviamente ninguém está preocupado e quem devia zelar pelo nosso interesse enquanto povo, prefere beijar a mão da Sr.ª Merkel e perspectivar negócios e cargos futuros. Para o Primeiro-Ministro o importante foi discutir a “oferta” da EDP à eléctrica alemã… interesse nacional é um conceito estranho…

quarta-feira, dezembro 07, 2011

Irlanda ou Islândia? Austeridade ou crescimento?

Um dos argumentos mais utilizados para defender a inevitabilidade da austeridade, tem sido o sucesso da Irlanda. Mas qual sucesso? Com quatro anos de austeridade, menos 20% do PIB, eis o que se passa na Irlanda:

«O Governo da Irlanda, o segundo país do euro a solicitar um programa de assistência financeira, está a implementar mais cortes orçamentais com o objectivo de convencer os investidores de que será capaz de regressar aos mercados em 2013. O país caminha para o quarto ano de medidas de austeridade, que equivalem já a 20% do PIB. (...) O anterior Governo irlandês começou a implementar medidas de austeridade em 2008. Desde então, o rendimento médio de uma família irlandesa baixou 423 euros por mês. A economia encolheu 15% e a taxa de desemprego disparou para 14,5%, contra os 4,8% verificados em 2007.Apesar das medidas de austeridade na Irlanda terem sido implementadas com sucesso e o país estar a ser elogiado pelas entidades que o estão a financiar, os juros da dívida pública irlandesa têm subido nas últimas semanas, voltando a aproximar-se dos 10% na maturidade a 10 anos.» 
Grande caminho este da austeridade… nem os mercados acreditam nele, pois os bons alunos irlandeses continuam a ter juros de 10% (recordo que o nível aceitavel seria abaixo dos 7%). Mais uma nota, a Irlanda está a tentar regressar aos mercados em 2013, com muita pouca probabilidade. Quatro anos depois e não conseguem voltar aos mercados, no entanto o nosso semi-deus da finança, Vítor Gaspar, acha que Portugal volta aos mercados em 2013. Pois claro que volta… E que tal, pararem de mentir descaradamente e deixar de apontar a Irlanda como bom exemplo?
Para quem diz que não há alternativa à austeridade, basta olhar para o verdadeiro bom exemplo da Islândia:
Não interessa referir o sucesso islandês, nem dar ideias aos cidadãos de criar assembleias constituintes e serem eles os decisores políticos. Os portugueses não têm a consciência cívica dos islandeses, mas também lhes é escondido que existem alternativas e que vale a pena tomar a democracia nas mãos. Entretanto caminhamos alegremente para o desastre, a austeridade terá um efeito tsunami no nosso país do qual dificilmente vamos recuperar. Jorge Bateira explica bem a situação neste artigo:

«O fundo da crise está resumido na frase de um analista financeiro: “A esperança inspiradora do apoio inicial da Alemanha à experiência do euro, a de que os restantes estados-membros convergiriam para os seus padrões de eficiência e competitividade, sempre foi pouco convincente mas agora é considerada completamente irrealista.”  Qualquer que seja a próxima manobra da UE para enfrentar o fim do euro, subsiste a questão crucial: como é que os países que sistematicamente acumularam défices na sua relação com o exterior, e por isso têm hoje uma elevada dívida privada, vão retomar o crescimento sem gerar novos desequilíbrios?

A resposta dos crentes na religião neoliberal é que a UE deve impor uma terapia de choque aos países endividados. Através da criação de um enorme desemprego, reduziremos o nosso nível de vida para que as exportações possam competir com as dos países de baixos salários. Com um maior peso das exportações na economia, competindo através dos custos, e com a privatização de bens públicos, garantem--nos que o país crescerá. Percebe-se que não falem de desenvolvimento. (…) Portugal bem precisa de uma nova esquerda, com ambição de governar o país. Uma esquerda que enquadre a questão da competitividade da sua economia numa estratégia de desenvolvimento guiada pelo interesse nacional. É em função dessa estratégia que deve ser equacionada a relação do país com a Europa e com o resto do mundo. Caso contrário, tornar-nos-emos para sempre uma província europeia pobre, desertificada, com orçamento feito em Bruxelas (leia-se Berlim).»


Da Europa só podemos esperar soluções que aceleram a queda no abismo, o euro não resistirá e nós seremos os escravos miseráveis da Alemanha, sem dinheiro e sem poder de decisão. Fiquemos pacificamente a aguardar o trágico desfecho, seguir o exemplo dos islandeses é que não…

terça-feira, novembro 29, 2011

Confirma-se o pior...



Já escrevi neste blog um texto que falava numa estratégia de eliminação dos pobres e dos doentes. Quem leu achou exagerado... Recordo as minhas palavras há dois meses atrás:


Nestas alturas queria não ter tido razão. Espero que agora as pessoas percebam porque se devem empenhar em lutar contra estas políticas. Antes que morram mais crianças inocentes...

quarta-feira, novembro 23, 2011

"Vim por ti. Venho por mim. Vens connosco?"


Foto de Ricardo Alves

Calar ou protestar?



 Amanhã é dia de greve geral e manifestação em frente à Assembleia da República. Não se pode questionar os motivos que levam à greve, nunca foram tantos e tão gravosos. Pode questionar-se se a greve é de facto o meio de luta mais eficaz, apesar de eu achar que se deviam pensar em novas estratégias de contestação, elas ainda não foram definidas. Portanto sobra a greve e a manifestação, são as únicas armas que o cidadão comum que não é dono de um banco ou de uma grande empresa, tem ao seu dispor. A alternativa é não fazer nada, deixar tudo como está, o que tem acontecido nos últimos anos e que nos conduziu à situação dramática de hoje. Para quem diz não adianta nada, faça o favor de olhar em redor e ver as consequências da passividade pós 25 de Abril. Se alguém tem dúvidas acerca do ponto a que se chegou, basta ver este vídeo e os indicadores de desigualdade que colocam Portugal na pior posição possível. E isto foi antes de Passos Coelho. Não é díficil imaginar o depois. Familias empobrecidas, a perder a casa, o emprego, a não conseguir fazer face à subida dos preços e dos impostos, a ver escolas e hospitais a fechar, assim como outros serviços públicos fundamentais. Dizem-nos que o dinheiro não chega, mas chegou para o BPN, chegou para engordar Oliveiras e Costa, Dias Loureiro e Duartes Lima. Há dinheiro para a Banca apresentar lucros milionários, assim como as maiores empresas do mercado. Até produzimos riqueza suficiente para 18 milhões de euros por semana sairem para offshores. Há dinheiro para reformas douradas, subvenções vitalícias e salários milionários. As 28 maiores empresas portuguesas, que enriquecem com o nosso trabalho e com o que consumimos, nem sequer têm domicilio fiscal em Portugal. Enquanto uns são sobrecarregados de impostos, roubados nos seus salários e pensões, outros descontam zero. Não há dinheiro? Porque a maioria da população entre reformas de miséria e salário mínimo, não traz para casa nem 500 euros, está a viver acima das suas possibilidades? Chega de insultos e enganos. Ninguém tem dúvidas do dramatismo da situação. Falta é ter consciência que a nossa resignação, determinará a miséria do nosso futuro e o dos nossos filhos. Lutamos contra uma elite que nos quer pobres, rendidos e escravizados, que querer absorver a riqueza e o poder. Manipula o governo e mistura-se com ele, nunca será chamada a fazer sacrificios porque ameaça levar o dinheiro para fora do país. Só no dia em que o cidadão mostrar que também faz parte da equação, será ouvido e respeitado. Se não fizer parte da equação, será tratado como lixo, há que ter consciência disso. Amanhã é a nossa oportunidade, desperdiçá-la será um erro.

PS. Uma nota final para os que se julgam invulneráveis porque ainda têm um bom emprego, porque trabalham numa boa empresa. Pensem no que acontecerá à empresa quando os clientes não puderem pagar. Os que são funcionarios publicos, mesmo sem dois salarios, acham-se invulneraveis porque ainda têm emprego. Pensem no que lhes acontecerá com um governo que não acredita em serviços publicos e que tem ordem da Troika para despedir? E os comerciantes e pequenos empresarios, donos de cafés e restaurantes, o que acontecerá quando os clientes não tiverem dinheiro para consumir. Neste país não há cidadãos trabalhadores invulneráveis.

quarta-feira, setembro 14, 2011

Alternativas à austeridade



Economista Nuno Teles em entrevista

quarta-feira, julho 27, 2011

Nada os afecta...

Depois do imposto extraordinário, o cidadão comum é brindado com aumentos nos transportes públicos na ordem dos 20%. A única coisa que não aumenta é mesmo a remuneração do trabalho, essa até diminui. E qual é o argumento? Nem é o desvio que afinal não é colossal, são as enormes dívidas das empresas de transportes, que de acordo com a Troika terão de ser reduzidas. A questão é, porque é que as empresas de transportes públicos se encontram endividadas? Não vamos pensar que a culpa foi de sucessivos gestores incompetentes que foram nomeados pela filiação politica e não pela capacidade de gestão, vamos pensar que a culpa está nos preços cobrados aos utilizadores e portanto a culpa é deles. Eles que paguem. O facto dos nossos transportes públicos serem dos mais caros da Europa também é irrelevante. O facto do nosso país precisar de reduzir a factura com importações de combustível, desincentivando o uso do transporte privado também é irrelevante. Já nem falo na capacidade das pessoas suportarem o aumento, isso sim irrelevante para este governo. Para isso serve a desculpa de que existirão tarifas sociais para as famílias pobres. Só não se explica como, nem a quem… tendo em conta que o governo acha que quem ganha mais que o salário mínimo é rico, prova-se a condição de pobre com IRS, leva o IRS quando compra um bilhete? E quem não declara o que recebe? E quem lê a declaração, a bilheteira electrónica? Perguntas parvas, certamente…

É pena que o rigor com o aumento da receita, não passe por outros domínios. A austeridade e a necessidade de reduzir o défice deixam de fazer sentido, quando o Estado abdica das Golden shares. Nove países europeus entre os quais a Alemanha, mantêm as suas golden shares em empresas estratégias, o governo português oferece-as de bandeja sem qualquer contrapartida. Centenas de milhões de euros oferecidos aos accionistas... Não faz mal, pede-se um imposto extraordinário a quem trabalha e não vive de dividendos de acções, aumentam-se os transportes, reduzem-se as indemnizações por despedimento... Octávio Teixeira já referiu e muito bem que se trata de um crime. Só lamento que as pessoas encarem de ânimo leve, a perda de milhões de euros que resultaram do esforço de todos os contribuintes, desde os nossos avós aos nossos pais. Todos contribuíram para que existissem linhas de alta tensão, postes de comunicações e todo um serviço de importância estratégica, e agora dá-se tudo, assim de graça? Os cidadãos que levam uma vida a pagar uma casa, uma propriedade também a venderiam à borla? Os portugueses nunca conseguiram entender o conceito de bem público, mas hoje em dia, ultrapassam-se todos os limites. Nada indigna os portugueses. Veja-se a recente sondagem da SIC. Nada os afecta ou pouco.

segunda-feira, julho 18, 2011

E que tal, um bocadinho de coerência?

Tenho reparado num fenómeno curioso de afirmação de tudo e do seu contrário com escassos meses de intervalo. O mesmo Presidente da Republica que dizia que “Aqueles que insultam os mercados estão a prejudicar seriamente o país. Deus nos livre se o Presidente da República não mede as palavras que usa”, hoje vocifera que são “uma ameaça à estabilidade da economia europeia” e que a descida de 'rating' português executada pela agência Moody’s é “escandalosa”. O candidato Passos Coelho que não ia aumentar os impostos e não sacrificar os mesmos de sempre, chega ao poder e puxa da cartola um imposto extraordinário esmagador. Não se ia desculpar com os erros do governo anterior, mas hoje fala de desvio colossal das contas, esse enorme desvio que escapou à genialidade fiscalizadora do FMI e dos técnicos da UE.

As mesmas pessoas que saíram à rua indignadas no dia 12 de Março, perante o corte do subsidio de natal, o aumento dos preços, da precariedade e do desemprego, da degradação dos serviços públicos, estão agora caladas e acham que tudo isto não é motivo de indignação. Porquê indignarem-se? Afinal quem tem rendimentos de juros, dividendos e acções não paga imposto extraordinário. A banca não só não paga, como recebe milhões do FMI. As empresas não têm nenhum aumento do IRC e até vão contribuir menos para os sacrifícios, com a descida da taxa social única. Tudo isto é da mais elementar justiça. E quanto às privatizações? Porque nos havemos de indignar quando serviços que financiamos estes anos todos, são oferecidos aos privados, que depois se encarregam de nos vender esses mesmos serviços, com um preço triplicado? E com que qualidade, se o objectivo é o lucro? Qualquer indignação não se justifica. Afinal estamos a abdicar da nossa dignidade e dos nossos direitos em prol de um bem maior, o pagamento da dívida. Claro que todos os sacrifícios, toda a austeridade nos darão um destino diferente dos gregos. Como se a nossa divida com juros fosse pagável... Nem explicando isto através de uma metáfora simples: nada disto tem a ver com aquelas famílias endividadas que resolvem os problemas com créditos a taxas de juro de 25% e acabam na bancarrota.... Não, não se indignem, façam os sacrifícios que os ricos e poderosos não querem fazer... e tudo vai acabar bem... para eles... para o cidadão comum sobram as misericórdias, soa bem, não soa?

terça-feira, julho 05, 2011

Então vamos além do acordo com a Troika e ainda assim a nossa dívida é “junk”?

Será que li bem? Então não era suficiente ter um novo governo, cumpridor e credível, discípulo zeloso das políticas de austeridade e do neo-liberalismo, que vai para além do duramente exigido pelo FMI? Não acalmamos os mercados? Lixo? O que é feito das analises competentes das agencias de rating? Podemos conceber dois tipos de resposta:
  1. O único critério de agências como a Moody’s resume-se ao lucro que podem obter com os elevados juros da dívida de um país e nesse sentido qualquer medida terá sempre como consequência a descida do rating. Factos que apoiam esta ideia: Vamos de PEC em PEC, como bons alunos de austeridade e o resultado foi sempre descida do rating. Para além disso agências como esta, durante a crise imobiliária de 2008, classificaram com AAA empresas que faliram no dia seguinte...
  2. As agencias de rating fazem de facto análise económica competente e desinteressada, chegando à conclusão que as politicas de austeridade vão mergulhar o país numa profunda recessão, que o impedirá de pagar a dívida. E o corte no subsídio de Natal e outras medidas além-da-troika só vão apressar o processo. Factos que apoiam esta ideia: a classificação de lixo surge poucos dias depois do anuncio das novas medidas

E já agora, poupem-nos à ridícula declaração de que a Moody’s desconhecia o corte no subsídio de Natal e outras medidas além-da-troika, estamos na Era das novas tecnologias e as noticias não demoram meses a chegar aos EUA... E não estamos a falar de peritos competentíssimos e bem informados? É que o relatório diz isto: « Economic growth may turn out to be weaker than expected, which would compromise the government's deficit reduction targets. Moreover, the anticipated fiscal consolidation and bank deleveraging would further exacerbate this.»

segunda-feira, julho 04, 2011

Ingenuidades, imbecilidades e supresas

Houve quem esquecesse convenientemente que Pedro Passos Coelho prometeu ir para além do acordo assinado com a Troika. Houve quem não quisesse falar da sua declaração em Bruxelas, afirmando que o chumbou o PEC IV porque este não ia suficientemente longe. Durante a campanha eleitoral, ninguém estranhou que o PSD nunca tenha explicado em concreto, o que significa ir além das medidas impostas pelo FMI. Ingenuamente, para não dizer imbecilmente, a eleição tornou-se numa não eleição de José Sócrates, não interessando a alternativa. Agora o resultado está à vista, temos o programa de governo mais injusto e anti-social desde o 25 de Abril, com consequências tremendas não só para os mais pobres, mas para toda uma classe média e comprometendo a sobrevivência futura do Estado Social.

As ingenuidades, imbecilidades e convenientes esquecimentos cederam lugar à surpresa. Um corte de 50% no subsidio de Natal? Mas isso nem estava no acordo com o FMI... pois não, mas foi referido por banqueiros e economistas do PSD do movimento Mais Sociedade. António Carrapatoso defendeu o corte do 13º mês, João Duque defendeu que as empresas paguem menos impostos, aumentando o IVA. Aliás foi um dos factores que eu referi para não votar no PSD, quando escrevi sobre isso. O que pode surpreender talvez seja a falta de vergonha, uma medida não referida no programa eleitoral, que nem foi prevista pela rigorosa análise dos técnicos do FMI há somente 2 meses atrás. Nada disso importa quando há uma agenda ultra-liberal a cumprir! O que interessa o impacto dramático na vida das pessoas? Afinal há sempre as misericórdias para alimentar os pobres (sim porque do Estado esperem apenas vales para alimentação, porque os malandros dos pobres quando se apanham com dinheiro na mão esbanjam tudo...).

Só mesmo falta de vergonha, pedir a quem trabalha por conta de outrem, que dificilmente se mantém à tona tendo conciliar a perda de rendimentos com o aumento do custo de vida, que faça tal sacrifício quando se vai vender a desbarato tudo quanto o Estado tem de lucrativo. Como pode alguém aceitar pacificamente a perda de metade do 13º mês, quando Passos Coelho tenciona privatizar sectores que dão milhares de euros de lucro? Com a agravante ainda, de se exigirem mais impostos para cada vez menos serviços do Estado. Nada escapará. Caminhamos a passos largos para uma sociedade em que os ricos que podem pagar saúde, educação e transporte público com menos impostos, terão a melhor das vidas, enquanto os mais pobres assoberbados com impostos, não terão como pagar os serviços mais básicos, ficando com os restos do Estado social.

Graças às ingenuidades, imbecilidades e convenientes esquecimentos, chegamos isto. E não vamos ficar por aqui, é só o início. Qual será a próxima surpresa ou devo dizer choque? O aumento espantoso do IVA? O despedimento de funcionários públicos? O encerramento de câmaras municipais e juntas de freguesia? Será que o choque cura a imbecilidade?

domingo, junho 26, 2011

“Enough is enough”

Nos últimos dias, os gregos andam nas bocas do mundo. Não como as vítimas de um plano selvagem de austeridade fracassado, mas como uns preguiçosos que não querem trabalhar e ainda por cima se fartam de fazer manifestações e greves. Nada disto é por acaso, nenhum dos políticos quer admitir o fracasso ideológico, o problema está nos povos não está em políticas económicas destruidoras do tecido social, do emprego e do crescimento económico. A comunicação social como aluno bem comportado, passa a imagem que se pretende: os gregos nas esplanadas, os gregos a partir montras, os gregos que se reformam aos 53 anos... Farto de insultos, um blogger grego escreveu um excelente texto chamado “Democracy versus Mythology: the battle in syntagma square”. Recomendo a leitura do texto original, porque este não é um problema grego, é um problema nosso.

É de destacar a forma como a Grécia foi humilhada e atacada na sua soberania e no seu orgulho nacional, como se sente um povo a quem é recomendado vendam as vossas ilhas, vendam a Acrópole? O próprio autor admite que os gregos foram seduzidos pelo modo de vida ocidental e consumista, atraídos pelo credito fácil e pelas taxas de juro extremamente baixas, mas o principal problema foi a corrupção e má gestão do dinheiro público. Não sabemos nós o que isso é? Fala dos artigos de opinião altamente injuriosos e preconceituosos, que não têm em conta a realidade grega e dá exemplos concretos como o número de horas que os gregos trabalham anualmente. Reproduzo aqui o gráfico, dado que Portugal também consta desta estatística. E se não trabalhamos as 2120 horas dos gregos, as nossas 1740 horas batem as 1430 dos alemães... um dado curioso sobre o povo que nos chama de preguiçosos.



O autor desfaz mais alguns mitos quanto à idade da reforma, estão dentro da média da OCDE nos 60 anos e quantos aos níveis de desenvolvimento, a Grécia estava em 22º no ranking de países com maior nível de desenvolvimento em 2008. Mas o maior mito é que o plano de resgate foi efectivamente concebido para salvar os gregos. O objectivo era estabilizar a zona euro, tranquilizar os mercados e ganhar tempo. Se a preocupação fosse a Grécia, está não teria sido obrigada a gastar biliões de euros em armamento comprado à Alemanha e à França.

O ultimo mito: os gregos querem o resgate, mas não o querem pagar. Falso. Os gregos não querem o resgate, porque já aceitaram o primeiro e vêm agora os resultados que não conseguem suportar. Desde cortes nas pensões, suspensão de benefícios sociais, muitos gregos já recorrem à pequena propriedade no campo para sobreviver. Diz o autor, os gregos não estão a lutar contra os cortes, mas sim pelo facto de já não existir onde cortar - “Enough is enough”:

«We will not suffer any more so that we can make the rich, even richer. We do not authorise any of the politicians, who failed so spectacularly, to borrow any more money in our name. We do not trust you or the people that are lending it. We want a completely new set of accountable people at the helm, untainted by the fiascos of the past. You have run out of ideas. »

Este não é um problema grego, é um problema de todos. Somos alvo das mesmas criticas, das mesmas humilhações, dos mesmos cortes odiosos. Está em causa uma batalha pelo direito dos povos à autodeterminação e à soberania contra os interesses do capital financeiro, que nos trata a todos como gado, que só existe para seu beneficio. O sistema que nos querem impor absolve os culpados e faz recair sobre os pobres, os desprotegidos, os trabalhadores honestos o custo dos sacrifícios. Os gregos disseram basta e pergunta o autor o que vão vocês dizer, deixando um ultimo conselho:

«Wake up before you find yourself in our situation»

sexta-feira, junho 24, 2011

Trata-se de uma guerra

Poucas vozes têm a coragem de descrever a dura realidade tal como ela é, trata-se de uma guerra feita pelo capital financeiro aos mais elementares direitos dos cidadãos. Os governos escolheram ficar ao lado do capital financeiro e não dos cidadãos que os elegeram. Esta é uma dessas poucas vozes que representam alternativas:
  • Nacionalizar temporariamente o sistema financeiro por ser a única forma de travar os capitais especulativos
  • Auditoria imediata à dívida pública e à dívida dos bancos (há aspectos duvidosos como a compra dos submarinos, o BPN e o BPP)
  • Suspensão do pagamento das parcerias público-privadas
  • A economia não é uma corrida de atletismo em que os mais fortes vão à frente porque os que ficaram para trás, têm que se esforçar e correr mais - é um sistema de interdependências
  • Alargar o espaço de debate a todos os cidadãos europeus

sábado, junho 18, 2011

O Cardeal divino economista

Não tenho tido qualquer vontade de escrever sobre um país em avançado estado de negação. Um novo governo vai resolver os problemas todos. Génios todos eles. As medidas selvagens de austeridade impostas pela Troika, executadas com competência, vão conduzir-nos ao melhor dos mundos. Recusam-se a ouvir até prémios Nobel da economia, que passo a citar mais uma vez:

«Os líderes europeus ofereceram empréstimos de emergência aos países em crise, mas apenas em troca de compromissos com programas de austeridade selvagens, feitos sobretudo de cortes da despesa. A objecção de que estes programas põem em causa os seus próprios objectivos - não só impõem efeitos negativos drásticos à economia, mas ao agravar a recessão reduzem a receita fiscal - foi ignorada. A austeridade acabaria por estimular a economia, dizia-se, porque aumentaria a confiança.(...) No entanto, como já disse, a fada da confiança até agora ainda não apareceu. A crise económica nos países europeus com problemas de endividamento agravou-se, como seria de esperar, e a confiança, em vez de aumentar, está em queda livre. Tornou-se evidente que a Grécia, a Irlanda e Portugal não serão capazes de pagar as suas dívidas na totalidade, embora Espanha talvez se aguente.»

Paul Krugman


Joseph Stiglitz

E porquê a citação? A citação vem a propósito das declarações do Cardeal Patriarca, que aconselha os portugueses à passividade perante as duras medidas que aí vêm. Esse ilustre economista de inspiração divina, vem certificar uma politica que conduz ao desastre. Faz muito bem colocar-se ao lado do sistema que o alimenta, mas por favor poupe-nos à hipocrisia de que defende os pobres e oprimidos. Se os defendesse, leria Krugman e Stiglitz e saberia o erro que está a ser cometido com o acordo com a troika e incitaria os portugueses a insurgirem-se contra essas politicas. Assim somos levados a pensar que a Igreja tem muito a ganhar com a pobreza e a miséria...

sábado, maio 14, 2011

Se o memorando da Troika é mau, ainda não leu o programa do PSD

Quem leu os posts anteriores já terá percebido que o plano do FMI, é um verdadeiro homicídio económico e social. Não fosse isso suficientemente grave, o principal opositor ao governo que negociou a sentença de morte, acha que o crime não têm suficientes requintes de malvadez. O PSD acha que se deve ir mais longe. Acha que se devem perder ainda mais direitos sociais, privatizar mais entidades públicas, aumentar o peso do IVA enquanto se reduz a taxa social única para as empresas. Convém perceber o que está em causa, quando se privatiza bens, serviço essenciais ou monopólios naturais. Quando o Estado controla estes sectores garante uma universalidade do acesso, a preços mais reduzidos, preside a lógica do interesse público e não a obtenção de lucro ou as regras do mercado. Veja-se o que aconteceu com a privatização do mercado dos combustíveis, os preços têm vindo a subir descontroladamente e de forma cartelizada, quer o petróleo baixe ou suba. É isso que queremos que acontece aos comboios, ao metro, ao correio, à água? Sim, nem a empresa Aguas de Portugal escapa ao plano de privatizações do PSD! Isto só acontece em 2 países no mundo, porque já se trata de monopólio natural e tem um valor essencial inegociável. Imagine-se o que seria lucrar com a captação de água, pagava-se o que fosse preciso porque não há alternativa. Quando a lógica é o lucro, podemos perguntar quem vai garantir que uma aldeia em Bragança tenha acesso a serviços, se o custo é muito mais elevado? Alguém vai querer saber se há cidadãos que não podem pagar a factura?

E o que dizer da taxa social única? É o imposto que as empresas pagam para assegurar que o acesso à segurança social dos trabalhadores… vamos colocar em causa as reformas futuras, a sustentabilidade do sistema? Para proteger de igual forma grandes empresas altamente lucrativas como a Cimpor e a Jerónimo Martins e as pequenas empresas, retirando o ónus do imposto mais cego e injusto, o IVA? Mas que raio de distribuição de sacrifícios é esta? O IVA pesa mais no bolso dos que têm pouco, porque há bens que não podem deixar de consumir? Mais sacrifícios, quando quem os podia fazer não faz? Os economistas do PSD falam em descidas de 4, 8 a 12 pontos percentuais (cada voz sua sentença, como é hábito). então um país endividado a precisar de receitas, vai abdicar de 3 a 4% do PIB?? Mas isto é racional? Na cabeça dos ultra-liberais é, porque as suas empresas aumentarão os lucros e os parvos dos cidadãos entram com os tais 3 a 4% do PIB, porque afinal não vivem do ar e vão ter que suportar o IVA. Esclarecido? Então vá lá votar nesta lógica dos mesmos do costume... sem esquecer que o PS se comprometeu também na redução da TSU, só não diz em quanto!

segunda-feira, maio 09, 2011

O que vem no memorando na Troika e não convém que se saiba o que significa - Parte III

Nesta terceira parte, vamos ver como se pretende atacar duramente os direitos laborais, de uma forma anti-constitucional, especialmente gravosa para quem depende exclusivamente da sua força de trabalho. Comecemos por ver o que acontece, a quem fique desempregado:

«Redução do desemprego de longa duração, reduzindo o subsidio de desemprego para 18 meses, tecto máximo do subsidio 1000 euros e redução de 10% no subsidio passados 6 meses de desemprego, facilitar a transição entre ocupações, firmas e sectores; o subsídio de desempregado será alargado aos trabalhadores independentes que tenham prestado serviços a uma só empresa, numa base regular»

Parte-se do princípio que quem fique desempregado consegue arranjar emprego num espaço de um ano e meio, o que em Portugal com o estímulo à criação de emprego, é tarefa fácil. Aliás até se pressupõe que em 6 meses se resolve a situação, porque já se está a cortar 10% do subsídio. Veja-se o drama para quem já auferia um salário baixo antes de ser afectado pelo desemprego… Por outro lado o facilitar a transição entre ocupações, significa que as pessoas poderão ter que aceitar um trabalho numa função diferente. E já agora, atenção à salvaguarda no acesso dos trabalhadores independentes ao subsídio, uma medida que seria justa, não fosse vincular a prestação de serviço a uma só entidade, numa base regular. Quem tiver prestações a várias entidades, já não tem direito ao subsidio…

«Reforma dos contratos de trabalho, indemnizações reduzidas de 30 para 10 dias por ano de trabalho, os despedimentos individuais ligados ao desajustamento do trabalhador às condições de trabalho são possíveis mesmo que não exista introdução de novas tecnologias ou mudanças no local de trabalho; a extinção do posto de trabalho não precisa de estar vinculada à antiguidade na empresa, sem que exista obrigação de transferir o trabalhador para uma função idêntica; aumento da flexibilidade horária e adopção do banco de horas; revisão do pagamento de horas extraordinárias em 50% e eliminar a compensação de horas por dias de ferias, só haverá aumento do salário caso aumente a produtividade.»

O capítulo da reforma dos contratos de trabalho é explica-se a si próprio. O esforço e dedicação anual de um trabalhador à empresa valem somente 10 dias de trabalho. O despedimento fica facilitado porque a inadequação do trabalhador, deixa de ter que ser justificada. Se a Troika conhecesse o termo “razão atendível” proposto pelo PSD, teria sido colocado aqui. A empresa nem tem que fazer uma tentativa de colocar o trabalhador numa outra função. Por outro lado, quem não for despedido, será sujeito à flexibilidade horária, o que na pratica significa trabalho fora de horas, que o banco de horas sugere que não será pago, e caso as horas extra sejam pagas, seja domingo ou feriado nunca excedem os 50% do valor habitual… Tendo em conta que na maioria dos trabalhos, quem cumpre a sua hora, já é olhado de lado e quem recebe horas extra as faz, para compensar um magro salário, o panorama não é bonito. Mas piora quando se afirma claramente que só existirá aumento salarial, se a isso corresponder aumento da produtividade. Se pensarmos que o trabalhador não controla nem os factores de produção, nem a gestão e organização do trabalho pelas chefias e muito menos os custos de produção, como poderá garantir o aumento da produtividade só por si? Tendo em conta a falta de qualidade dos gestores e os elevadíssimos custos de produção no nosso país, há produtividade como? Pode contar com congelamento ou mesmo redução salarial… Mas afinal, isto é um bom acordo, não é?

domingo, maio 08, 2011

O que vem no memorando na Troika e não convém que se saiba o que significa - Parte II

Continuando o post anterior, mais medidas do memorando da troika. Acerca da banca, das privatizações e das empresas públicas: venda-se o ramo de seguros da CGD, o que faz todo o sentido pois dá lucro a um Estado que precisa de dinheiro, encontrem um comprador para o BPN até Julho, nem que seja ao preço mínimo, porque afinal quem pagou aquilo foram os parvos dos contribuintes, bem se pode vender por tuta e meia, sem recuperar o dinheiro (também deve ser fácil, aparecer um comprador até Julho que em 2 anos não apareceu). Segue-se um capitulo sobre a forma generosa como o Banco de Portugal ajudará a banca nacional a obter financiamento… Sem comentários

«Proibição de novas parcerias publico-privadas e revisão das actuais PPP»
Possivelmente a única coisa digerível neste memorando, mas peca por não explicar quanto é que isso vai custar ao estado, dado que existem indemnizações compensatórias…

«Privatização progressiva das empresas publicas (aeroportos Portugal, ANA, CP carga, CTT, GALP, EDP, REN, Caixa Seguros)»
Mais uma vez, não há preocupação com o lucro para o Estado, estes sectores podiam contribuir para a receita do Estado. Mas a agenda da Troika é ideológica, é neoliberalismo puro e duro, independentemente da viabilidade económica da medida… quanto ao cidadão que usa o comboio (fala-se especificamente das linhas suburbanas e do transporte de mercadorias que dão lucro), pode preocupar-se e muito e começar a pensar em alternativas. E o que dizer dos CTT, quantos serviços dão lucro? Deixe de contar com eles… e prepare-se para deixar de ter isenção de IVA nos serviços de correio...

«Reforma na administração pública, redução dos gestores públicos, reavaliação de fundações e similares, reorganização do poder local, aglutinação e centralização de serviços públicos; mobilidade e flexibilidade dos recursos humanos, visando uma redução de 1% ano na administração Central e 2% na local»
Para além dos cidadãos que ficam prejudicados por ver câmaras municipais, juntas de freguesia e balcões de serviços públicos encerrar, isto significa redução de pessoal e piores condições para quem fica e tem que ser flexível. Ainda acredita que não vão existir despedimentos?

«Reforma do SNS: Controlo de gastos na saúde, com poupança a nível farmacêutico de 1.2 do PIB, aumento das taxas moderadoras, redução de 30% no orçamento da adse, adm e sad, reorganização da rede hospital, especialização e concentração de hospitais, aglutinando serviços, reduzindo pessoal e horas extraordinárias, relocação e mobilidade de funcionários, reduzir custos com transportes de pacientes em 33%; flexibilização do horário de trabalho»
O significa reduzir 1.2% do PIB com medicamentos? Significa que as comparticipações serão reduzidas à insignificância e serão os utentes a suportar a maior parte ou a totalidade dos custos com medicação. E sim, são os mesmos que têm de suportar a duplicação das taxas de IVA com reformas de 200 euros... Mesmo quem tenha adse deve preocupar-se, porque em 2 anos, pretende-se reduzir o orçamento em metade, quantas comparticipações ficam de fora? O mais preocupante é a reorganização e concentração da rede hospitalar que pressupõe certamente encerramento de hospitais. Também se fala em reduzir horas extraordinárias, isto é, tente não adoecer fora de horas ou espere mais tempo para ser atendido. E é bom ter o seu próprio transporte para chegar ou sair do hospital, porque os custos com transporte de pacientes são reduzidos em 33%...

(continua...)

sábado, maio 07, 2011

O que vem no memorando na Troika e não convém que se saiba o que significa - Parte I

Anunciado o acordo com a Troika, ficaram as pessoas muito tranquilas, porque não há cortes nos salários e não vão perder os 13º e 14º meses. O que não lhes disseram, foi que existem uma serie de outras medidas, que lhes vão custar mais que dois meses de salário. O que lhes dizem é que se trata de um bom acordo. Analisemos algumas medidas que eu tirei do memorando, para ver o bom que é. Vamos fazer isto por partes, porque ainda são 34 páginas e porque tudo de uma vez, é capaz de causar danos à saúde. Cá vai o inicio:

«Redução dos custos com educação em 195 milhões de euros, racionalizar a rede escolar e reduzir os custos de pessoal»
Como é que se reduz custos, racionalizando a rede escolar? Só uma forma, encerram-se escolas e para se atingir 195 milhões de euros, não serão duas ou três. Bem podem as pessoas deixar ter como garantida uma escola para os filhos… E a redução de custos de pessoal, não significa despedimentos?

«Congelamento de salários e promoções no sector publico»
Já estamos habituados, mas quando temos que pagar mais impostos e o custo de vida aumenta exponencialmente (como veremos a seguir), o congelamento de salários passa rapidamente a perda efectiva de rendimento.

«Redução de custos com empresas publicas em 415 milhões»
Não seria mau, se isto não afectasse os correios e as empresas de transporte. Está preparado para ver o custo do passe mensal dobrar ou triplicar ou mesmo para ver o transporte que usa reduzido ou suprimido?

«Corte em 150 milhões nos benefícios fiscais às empresas e 150 milhões nos benefícios fiscais aos particulares, colocando tectos máximos nas deduções em habitação e saúde»
Isto significa que o Estado retém mais impostos, os cidadãos não serão reembolsados mesmo que tenham encargos que o justifiquem. Menor rendimento anual…

«Aumento da receita do IVA em 410 milhões, alterando a categoria de bens e serviços dos escalões reduzidos e intermédio para o escalão máximo, aumento de impostos (automóveis, tabaco e electricidade)»
Esta medida só por isso demonstra a bondade do acordo! São capazes de calcular o aumento de preço de um produto cujo IVA passa de 6 para 13%, ou de 6 para 23%. É o caso do gás e a electricidade, nada essenciais... Como vão as pessoas com reformas de 200 euros suportar este aumento dos bens essenciais? Não vão, aliás nem quem ganha um salário mínimo e alguém está preocupado? Não, foi um bom acordo!

(continua...)

segunda-feira, abril 18, 2011

Mau demais...

Porque é que há dez dias, que não escrevo? Porque tem sido tudo tão mau, que me deixa estarrecida. Pegar em quê, falar do quê, se já não há pingo de sensatez em coisa alguma. A crítica seria positiva se comparada a um edifício, se pudesse manter os alicerces e reconstruir o resto. Mas nada disto é possível, com esta classe politica incompetente, esta banca traidora, estes economistas desumanos e esta comunicação social imberbe que os alimenta a todos. É um edifício que já só pode ser demolido, de preferência com uma daquelas demolições com dinamite em que só se vê uma nuvem de pó. Isto é um desfile de mentirosos, vendidos e lambe-botas sem remédio possível. Cabe na cabeça de alguém, que com o FMI a querer levar o país à bancarrota, a afiar a guilhotina que sentenciará de morte não só os mais pobres e desprotegidos, mas toda uma classe média, PS e PSD façam das mais tristes figuras da nossa vida democrática? Congressos apoteóticos, que mais parecem comícios fascistas ou assembleias da IURD (ia jurar que o António Vitorino estaria possesso por algum espírito demoníaco)? Abrir os partidos a oportunistas, arautos da cidadania que se vendem aos mesmos que traem os ideais, que antes defenderam? Revelar que se derrubou um governo, por não existir uma reunião que existiu de facto, estendendo a passadeira vermelha ao FMI? Descobrir que o partido da oposição consegue mentir mais que o seu adversário político? E depois querem que exista uma união nacional de toda esta gente imbecil? Devem entender-se? Não percebem que esse entendimento sempre existiu e o resultado está à vista, nenhum destes grupos fez mais nada, que não servir-se do bem público em proveito próprio. Um entendimento fantástico, para levar o país à degradação moral e politica, já não bastava a económica e a financeira…

Há uns tempos atrás, eu não usaria este tom insultuoso, seria construtiva na crítica, apontaria alternativas… e já falei de tantas alternativas, mas com esta elite que nos representa não há esforço construtivo que resulte. Porque não falam estas pessoas da necessidade de uma auditoria às contas, para se saber quem deve exactamente o quê? A divida é pública ou é sobretudo privada e se é privada, não foi a Banca a responsável? Porque se aceitam imposições externas, se a dívida podia ser reestruturada? É preciso que venham outras ideologias e outras propostas. São necessários políticos que defendam os cidadãos, o estado social, vendo o bem público como um fim em si mesmo. É preciso que as pessoas venham antes do lucro, antes da banca, antes da ditadura dos mercados.

sexta-feira, março 25, 2011

O festim da crise política

O que se me apraz dizer sobre a crise política, esse festim para os mercados patrocinado pelo PS e PSD? José Sócrates não devia ter-se comprometido com um PEC 4 sem dar conhecimento à Assembleia e ao Presidente da República, mas sabemos já que verdade e cooperação não são atributos que o caracterizem. Por outro lado, o governo está totalmente refém dos mercados e da Sr.ª Merkel e não tem praticamente poder de decisão (não esquecer que isto se deve ao rumo politico que PS e PSD têm vindo a seguir há longos anos). Não havia de facto, grande margem de manobra. O PSD sabe disso, tanto sabe que se comprometeu com os outros PECs e quem já apoiou esta estratégia, não deve saltar do barco a meio da viagem. Isto é tão mais grave, quanto o PSD sabe perfeitamente que uma crise política é um festim para os mercados, que vão descer o rating e fazer subir a divida publica, numa altura em que o país, dentro de 2 meses não terá dinheiro para assegurar salários. Mas o PSD não quer saber, ao PSD só interessa o poder e não o prejuízo que provoca ao país. O PSD quer que venha o FMI, que lhe poupará o trabalho de desmantelar o Estado Social e despedir funcionários públicos. Perante isto, José Sócrates e o famigerado PEC 4 são um pedaço de céu. Se vamos a eleições antecipadas, é entre o impossível e o péssimo que os eleitores ficam. Para quê pedir uma escolha destas? Se tivéssemos um Presidente da Republica activo e preocupado, poupava-nos a isto, aceitava a demissão de Sócrates e pedia ao PS para apresentar um novo governo. O PS não consegue arranjar um líder com mais consciência social, menos arrogância, maior apetência para a verdade e para o diálogo? No entanto, tudo aponta para eleições antecipadas (estas já não ficam caras ao país, como a 2ª volta das presidenciais?), sendo o mais preocupante desse cenário, o desconhecimento total dos eleitores das verdadeiras intenções do PSD. Não sabem a elite económica e perigosa que puxa os cordelinhos da marioneta Passos Coelho, não sabem o que significa a vinda do FMI, não percebem que vão ficar sem SNS, sem escola pública e sem apoio social. Este PSD não tem nada de social-democrata é outra coisa e é bom que as pessoas se informem e percebam isto, antes de votarem.

Onde ficam os restantes partidos no meio disto tudo? O CDS-PP partilha a ambição de poder do PSD e está convencidíssimo que será necessário para uma maioria, daí o interesse no acto eleitoral. À esquerda, os partidos que se recusam a ser poder, têm sempre afirmado que existem alternativas e que são absolutamente contra este PEC. O PCP acha que o governo podia continuar e que não iríamos a eleições, posição que me parece mais responsável que o desejo avassalador do BE nas eleições antecipadas. Um partido de esquerda responsável não pode desejar eleições que vão colocar no poder um partido de direita neo-liberal. Será o BE ingénuo ao ponto de pensar que o PSD não ganha as eleições? Ou pensará que obtém mais votos, depois da jogada politica da moção de censura, que mostrou aos eleitores que os queriam diferentes, que fazem tanta politiquice como os grandes partidos e ainda abrem a porta ao Passos Coelho? Têm toda a razão em apontar políticas alternativas, concordo absolutamente, mas sejamos pragmáticos, a realidade actual é que o governo está sem margem de manobra (a politica da UE não admite alternativas) e a direita mais neo-liberal de sempre pode chegar ao poder. É isso que querem?

Nota: A imagem é um cartoon de Quino.