quarta-feira, fevereiro 16, 2011

Dos parvos, dos hipócritas e dos lixados

Confesso que achei que a música dos Deolinda “Parva que eu sou” dispensava comentários, porque fala de uma realidade que já todos devíamos conhecer. A precariedade é por acaso alguma novidade? Não é... possivelmente musicar a precariedade é uma novidade nos dias que correm e se chamou a atenção de quem eventualmente andava distraído, melhor ainda. O que a música provocou foi uma avalanche de opiniões, que vão desde o aproveitamento politico da musica pela esquerda e pela direita à comoção hipócrita, passando pelo simples encolher de ombros.

Comecemos pelo aproveitamento político. Que a esquerda faça da música um hino não me surpreende, porque têm sido os partidos mais à esquerda que mais propostas têm apresentado no sentido de combater a precariedade no trabalho (faço a ressalva que o governo não é de esquerda e o que mais tem feito é agravar as condições de trabalho). O que me surpreendeu foi que a direita também pegasse na música, para dizer que foram os gastos exagerados do estado social com os direitos e garantias da geração anterior, os culpados da situação dramática da geração parva. Não há nada como criar um bom conflito inter-geracional! Esses sacanas que tiveram o privilégio de ter reformas, subsídios de doença e desemprego, não deixam os filhos passar dos recibos verdes e dos 500 euros mensais...Como é óbvio, não falam dos verdadeiros responsáveis pela situação, sucessivos governos pós-25 de Abril que fizeram uma gestão ruinosa do bem publico, alimentando clientelas e elites económicas que controlam a Banca, as grandes empresas e a Administração pública.

Depois existem os hipócritas, aqueles que ficam imensamente comovidos com a desgraça da geração parva, ou pelo menos dizem que ficam. Chamo-os de hipócritas, porque muitos deles têm posições de poder, pertencem à tal elite abusadora e têm a trabalhar para si jovens com recibos verdes, contratos precários e com salários baixos. Efectivamente podiam fazer alguma coisa por esta geração e não fazem, limitam-se a reconhecer a injustiça, mas não podem fazer nada, porque isso implicaria perderem regalias de novos-ricos das quais não estão dispostos a abdicar.

Depois existem os que encolhem os ombros. São os que acham tudo isto normal e inevitável, os que acham que é assim e não há nada a fazer, os que nem querem discutir o assunto, muito menos informar-se das alternativas e os que fulminam aqueles que se queixam e se revoltam contra a situação. Não querem chatices, nem preocupações. Os pais deram-lhes tudo e vão continuar a dar. Independência económica, dignidade ou realização são conceitos estranhos que ficam para os “lixados” procurarem. O que nos leva aos lixados. Por ultimo, os lixados são aqueles que não têm pais ricos que os sustentem, não têm cunhas, cartões de militante e para mal dos seus pecados, percebem o que está errado e até querem mudar o que está errado, mas sozinhos não podem... Então quem muda isto? Se os hipocritas não querem, resta saber quando é aqueles que encolhem os ombros ficam lixados...

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