Até que ponto, somos efectivamente livres?
«Ausência de excessos, mediania em tudo, limitações legitimadas pelos «costumes», quer dizer, pela própria coesão da sociedade civil — tudo isto que era sustentado pelo regime de Salazar é hoje suportado pela norma única invisível do bom senso. Não há outra via. O medo, de perder todos os benefícios materiais que a entrada na União Europeia proporcionou, enxertou-se no sedimento de temor que já existia, transformando-o. Nasceu um novo objecto em que se investiu, inconscientemente, o medo do medo, o pequeno terror, a exclusão, o próprio terror de ser excluído, ou de vir a ser objecto de conflito (que comporta a ameaça de exclusão). Ameaça que existe disseminada no interior do real, sem que se saiba quem é o responsável, sem que o real se desrealize. É pois sempre mais conveniente continuarmos a não assumir responsabilidades, a não afrontar opiniões contrárias, a fugir aos problemas e a não pensar mais além das soluções que entram no quadro de todas as integrações. Sobretudo, recusar os conflitos.»
Será que somos livres só porque vivemos em democracia? Não existe censura, não existe polícia política, não há um regime ditatorial que exerça uma coerção violenta sobre a nossa forma de agir... A agressão à nossa liberdade mudou de forma, somos coagidos pela norma social e pelo politicamente correcto. Temos medo dos olhares que nos julgam, temos medo da exclusão, temos medo de perder o emprego, se a nossa opinião foge à norma. A norma transformou-se na nova polícia política.
A repressão não é física, é psicológica e somos nós que a infligimos. Não estaremos nós perante a ditadura da estabilidade social, da não conflitualidade, do bom senso? Haverá forma mais eficaz de controlo que a pressão social e a auto-censura?
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