Democracia, conhecimento e estupidificação
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«As ditaduras opõem-se ao progresso do conhecimento em geral e ao das ciências humanas
Porque continua a haver um certo divorcio entre conhecimento e democracia e, mais especificamente entre, conhecimento da democracia e prática democrática. (…) Um diagnóstico sumário é bastante para pôr em evidência o divórcio parcial, ainda existente no nosso país, entre conhecimento e democracia:
A ausência de um espaço de transmissão horizontal e vertical de conhecimentos no campo social. Horizontalmente, traduz-se pela falta de canais de comunicação entre os membros de uma comunidade científica, por exemplo. Verticalmente pela falta de mediações entre camadas sociais que permitam que o conhecimento especializado seja filtrado, traduzido em termos simples («vulgarizado»), transmitido e sedimentado na cultura «geral» popular. Por várias razões, esse espaço não existe em Portugal.»
Será que 40 anos de ditadura se inscreveram de forma tão dura na mentalidade portuguesa, que ainda hoje não sabemos discutir, trocar ideias, pensar livremente. Por isso somos tão conformistas, nunca estamos bem, vamos andando e isso é o natural. Vamos aceitando o que nos impingem, não nos permitimos querer mais, querer alguma coisa diferente, melhor?
Estupidificamos? Não temos acesso ao conhecimento, porque não há um espaço de mediação, em que o conhecimento seja filtrado, isto é, que se torne acessível ao comum dos mortais. O que se passa é que existe uma camada social da população que está excluida socialmente à partida e que não reune as ferramentas cognitivas para lutar contra a estupidificação.
A mim pessoalmente preocupam-me estas vítimas de um processo de inclusão socio-cultural que nunca foi feito. Podemos questionar se existirá vontade política para encetar esse processo de inclusão... Até aí, continuaremos a estupidificar, mas não há problema, vamos andando…
18 comentários:
Será que 40 anos de ditadura .etc...é a primeira pergunta.
A resposta é sim.
Lamentavelmente o senhor Salazar está a vencer mesmo depois de morto.
Mas é natural. Verdadeiramente nunca teve oposição séria ao modelo dele.
Quanto à exclusão da camada social de população que existe ele materizaliza-se sob a forma de 9,5 milhões de portugueses.
O resto manipula os 9.5.
Eu costumava achar que, para apagar 40 anos de ditadura, seriam necessários outros 40, ou o de a geração que dela se lembra desaparecer: o tempo de esquecer, em suma. Hoje, começo a pensar que é precisamente o contrário, que é a nova geração a que menos pensa, menos critica com conhecimento de causa, mais aceita de forma acéfala. Não sei bem a causa disto, tem que ver com a estupidificação progressiva do sistema de ensino, por exemplo, mas com muitas outras coisas. Enfim, merecia um estudo sociológico...
aNTÓNIO.
MERECIA TUDO Menos um estudo sociológico.
A realidade dos factos é que uma certa geração pós 25 de abril nunca quis mudar verdadeiramente coisa nenhuma.
A JUNTAR A ISSO, ainda foi supremamente irresponsável, doida varrida, e totalmente inconsciente em relação a preparar o futuro.
Especialmente a esquerda.
Agora o resultado está à vista.
O modelo salazarista é olhado por ceros sectores como sendo bom, quando aquilo foi sempre uma merda.
A nova geração "menos pensa" porqu eisso deriva dos paiznhos deles, uma geração pós 25A do mais cretino que existiu.
Formatada no maio de 68 e parvoices semelhantes.
Agora temos o "ressalto" todo aí à solta disso mesmo.
Parece-me que esta questão não tem sido muito abordada pelos nossos sociologos. O José Gil fala nesta relação ditadura/falta de espírito crítico por isso é que o citei. Aliás ele tem outros excertos interessantes que acho que vale a pena postar e comentar.
De facto, não conheço outros estudos sociológicos portugueses, dentro deste tema, se alguém se lembrar de algum, agradecia que me dissessem. Porque o José Gil identifica o problema, mas não investiga as causas profundas.
O que eu acho estranho é que pessoas que não viveram em ditadura, partilhem essa alienação. Parece que este modelo de comportamento social foi-se enraízando na mentalidade portuguesa desde o Estado Novo. E agora que temos liberdade para pensar, continuamos à espera que alguém o faça por nós, como se fossemos crianças-adultos.
Cara hopes and dreams.
O José gil é neo liberal.
Já morreu.
E a julgar pelo excerto do texto quase tudo que ele escreveu neste texto são evidencias.
A razão para a ligação ditadura / falta de espirito critico está(e estou cada vez mais convencido disso) no que se passou imediatamente a seguir à revolução que tudo mudou para tudo ficar na mesma.
Em muitos aspectos.
Agora o que se está a passar como o que se passou há 10 anos atrás e há 20 anos são as bombas ao retardador deixadas para trás por uma serie de gente, bombas essas que viriam a rebentar mais à frente.
É também por isto tudo atrás escrito e pelo facto de o senhor Gil identificar o problema mas não dar soluções que eu escrevi o que escrevi neste comentário.
Porque o senhor gil assim como muitas outras pessaos da idade do senhor Gil tinham à data da revolução estática de 74 perto de 30 anos.
Toda essa gente falhou ao comprido.
30 anos depois reescreve a história.
Assim " apaga " as asneiras e a falta de visão desses tempos.
Esta alienação não é por acaso. Não é um fenómeno de geração espontânea.
É um fenómeno acumulado cuja velocidade se começou a acelerar em meados da década de 80.
Agora é que estamosa ver isto em todo o seu esplendor(ruina).
E não concordo com a ideia de termos liberdade para pensar.
Penso que temos menos liberdade para pensar, uma vez que, socialmente estamos condicionados a viver de uma certa e determinada maneira que, desde logo, condiciona sequer o pensar.
O exemplo disso mesmo são os blogs.
Ferramentas individuais únicas com potencialiaddes extremas e o que vemos?
Correntes de blogs cheios de gente a seguir acriticamente as ideias uns dos outros.
Sem sequer fazerem qualuer comentário ou critica ao que os outros escrevem.
Está logo condicionada a situação.
E interessa fazer uma ruptura aqui dizendo o seguinte e voltando ao salazarismo: no fundo muita gente que "fez" a revolução, até gostava daquilo e do salazarsismo e se o salazarismo lhes tivesse "dado"uma posição "alegre e simpática" nunca teriam feito revolução nenhuma.
A solidez das convicções era ... nenhuma.
A solidez de buscar poder e conforto era ... muita.
Portanto uma vez chegados ao poder e ao conforto, é necesário criar condições para que outros não lá cheguem.
Mas feito de maneiras diferentes daquelas que foram feitas em salazarismo.
Portanto ... o salazarismo, alguns aspectos do mesmo,são... agradáveis para ajudar a criar
" barreiras" aos novos ascensores.
Caro Pedro,
Muito sinceramente, não me interessa se o José Gil é neoliberal ou não, muito menos me parece relevante que ele tenha falecido (quando eu falei de outros estudos, referia-me a outros autores que tenham abordado esta questão). O que interessa é que as questões que ele aborda são pertinentes, e ao contrário do que possas pensar não são evidentes para muita gente... Por isso, tenciono continuar a citá-lo e a comentar o que ele diz, sem qualquer preconceito ideológico, manifestando concordância ou discordância.
Em relação, ao que tu dizes sobre a geração que fez o 25 de Abril, concordo contigo. Acho é que não podemos continuar a desculpabilizar-nos com os erros dos outros...
Cara hopes:
Tem bastante a ver o José Gil ser neo liberal ou não para algumas das coisas que ele diz / escreveu.
Quanto à geração que fez o 25A e os erros, o problema é que é essa geração que tem o poder, e não quer largar.
Prefere estoirar com tudo a largar o poder.
Ou em alternativa a entrega-lo aos pseudo neo-liberais cá da praça. Gente sem qualquer qualidade.
Isto está para lá de simples desculpabilizações com os erros dos outros.
É um problema sério e quase iresolúvel.
E não é por estarmos todos de repente, a funcionarmos bem, que as coisas se resolvem.
Essa fase, infelizmente, já passou.
Agora tudo isto pressupõe que existam pessoas obrigatoriamente a perder.
A serem colocadas num certo lado que os rotula como perdedores. Seja qual for a classificação de perdedores, definida.
Não é tão irrelevante assim neste caso atribuir culpas, uma vez que a sombra do senhor Salazar continua a flutuar sobre todos nós, e já passaram 32 anos.
Continua porquê?
Pode-se (agora está na moda) atribuir culpas aos portugueses como entidade pseudo colectiva que é responsável.
Pode-se dizer que cada um é responsável.
Muito bonito; muito lógico.
Mas impraticável sob o ponto de vistas dos efeitos em termos de mudança real.
Portanto temos que raciocinar ao contrário: quem quer que isto fique como está, quer por omissão, quer por acção?
A questão da definição de culpas neste caso, tem tudo a ver.
É preciso fazer sair para a luz os responsáveis, e não são os funcionários publicos que ganham 50 euros por mês.
"O que eu acho estranho é que pessoas que não viveram em ditadura, partilhem essa alienação. Parece que este modelo de comportamento social foi-se enraízando na mentalidade portuguesa desde o Estado Novo. E agora que temos liberdade para pensar, continuamos à espera que alguém o faça por nós, como se fossemos crianças-adultos."
Como disse o historiador Fernando Dacosta, que escreveu uma biografia de Salazar agora revista pelo próprio, nós nunca fizemos o luto de Salazar. Nem de D. Sebastião.
"Em relação, ao que tu dizes sobre a geração que fez o 25 de Abril, concordo contigo. Acho é que não podemos continuar a desculpabilizar-nos com os erros dos outros..."
Também concordo, obviamente. o 25 de Abril foi feito, em primeira linha, por capitães que estavam descontentes não tanto com a guerra mas com a fraca progressão nas respectivas carreiras... Mas claro que isso não pode desculpabilizar a geração "filha" do 25 de Abril, a nossa, tal como a educação que essa geração recebeu dos pais também só a desculpa até certo ponto. É por isso que acho que merecia um estudo sociológico aprofundado. Se não servir para esta geração, que sirva ao menos para a próxima.
numa coisa não concordo.
grande parte da geração que tinha entre 20 e 40 anos no 25 de abril fez um esforço incrível.
FIZ UM POST A PARTIR DA MINHA REAÇÃO A ESTE POST E RESPECTIVOS COMENTARIOS...
o meu comentário inicial já estava enorme.
António: Fernando Dacosta é jornalista.
Não historiador.
Quanto a um estudo sociológico servir para a próxima ... duvido.
A "próxima" são os actuais tipos de 15 a 20 anos, que não distinguem um trombone duma caixa de fósforos.
O meu amigo que frequenta história até se passa quando olha para os coleguinhas dele, que perante a noticia de que o curso passava de 4 anos a 3 anos, por causa do processo de Bolonha, em vez de ficarem irritados por o assunto ter sido decidido nas costas, e além disso ficarem mesmo prejudicados, não.
Estão é todos contentes porque "Já são finalistas"...yupii
e estão todos entusiasmados com a "realização da viagem de finalistas. Isto em Outubro/Novembro quando o ano acaba em Maio.
Perante esta mentalidade que, suspeito é a geral, achas mesmo que esta gente alguma vez lerá um estudo sociológico sobre si própria enquanto geração?
Duvido.
Mas já acredito que irão organizar uma viagem de finalistas dedicada às pessoas que pensaram em ler um estudo sociológico sobre a geração deles, mas não o leram.
Isto é o zero absoluto, mas o zero vai sempre descendo mais para baixo.
Pedro,
Não haverá um único sociológo, historiador, psicólogo, ensaísta português que mereça a tua consideração?
António,
Concordo inteiramente, qualquer estudo sobre a sociedade e mentalidade portuguesa que suscite reflexão, era muito bem-vindo
Cão,
Obrigado por fazeres do teu comentário um post. Já o fui ler e também acho que não podemos ser injustos com quem fez o 25 de Abril e manteve esse ideal, mas terás de reconhecer que uma certa elite, depressa colocou esses ideais na gaveta. E porquê? Poque o materialismo egoísta é mais cómodo que a lealdade a um ideal...
hopes,
esta questão de que estamos a falar tem de ser bem estudada sim, e pode sê-lo por sociólogos, etc...
mas com uma condição: que tenham menos de 35 anos.
as pessoas mais velhas do que isso estão completamente condicionadas à partida por uma falta de distanciamento.
ou seja, cabe à nossa geração olhar para trás e estudar este fenómeno.
o problema é que ao nível das universidades e centros de estudos, estes estão dominados pela geração que seria posta em causa se existisse um estudo sério sobre isto.
logo, esse estudo não se faz.
quem seria o orientador que aceitaria ser posto em causa pelo próprio orientando.
resta-nos o quê? observar, e, no meu caso, por opção minha, escrever sobre isto, mas sem os tais estudos.
talvez um dia, mais tarde...
seja como for, a minha área não é a sociologia nem a psicologia.
Cara Hopes:
"""Não haverá um único sociológo, historiador, psicólogo, ensaísta português que mereça a tua consideração?"""
NÃO!
Basta olhar para o estado da Universidade( considerada globalmente) em Portugal.
Internacionalmente valem o quê?
Cá, valem o quê?
Tem empregos garantidos, quer produzam trabalho académico válido(que não fazem) quer não produzam, quer assim assim.
Estou como o cão.
Pessoas abaixo dos 35 anos e mesmo assim...
Agora gente completamente enraizada no sistema, não vai " criticar" aquilo que julga ter sido um grande feito.
Olhe-se para Portugal e estamos ... longe... muito longe de tudo.
Realmente tenho de concordar que nas universidades, quem consegue carreira são os discipulos engraxadores dos senhores professores doutores... Quem se atreve a questionar ou refutar teses, é colocado de parte.
Aliás o nosso ensino universitário, estimula a reprodução e a repetição de ideias, sem questionar. Quem tem as melhores notas é quem reporduz com maior exactidão, o que o professor disse nas aulas. E as aulas são verdadeiros monólogos e ai de quem interrompa para colocar uma questão...
Hopes:é é das uversidades que deriva o problema disto tudo.
Pegando no que tu dizes: como é que coma repetição se irá criarqualquer coisa nova?
Se pensarmos bem, é um ciclo vicioso. Mesmo que essa geração com + de 35 anos se reforme e perca protagonismo, a geração que a substitui adquiriu os mesmos hábitos e a mesma forma de pensar. Porque nunca foram habituados a questionar o que já foi dito e muito menos a ter a sua própria tese.
Repara neste caso. Um licenciado em estudos portugueses com média 17, a quem eu perguntei o que acha do autor X, que publicou o seu 1º livro. A resposta foi um encolher de ombros seguido da debitação do que os professores lhe disseram sobre a nova tendência para a poesia autobiográfica. Insisti, mas não fui capaz de arrancar uma opinião pessoal, nem um simples, eu gosto ou não gosto...
Com o teu ultim comentário Hopes dizes a resposta a ti mesma e ao teu post.
E exactamente isso. É aliás essa a mentalidade que explica porque é que eu acho que a maior parte dos "craques" cáda terra nada valem.
O resultado é esse.
Mas não só.é uma questão defensiva da parte dele; apenas debitou a mensagem pré formatada...
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