domingo, junho 26, 2011

“Enough is enough”

Nos últimos dias, os gregos andam nas bocas do mundo. Não como as vítimas de um plano selvagem de austeridade fracassado, mas como uns preguiçosos que não querem trabalhar e ainda por cima se fartam de fazer manifestações e greves. Nada disto é por acaso, nenhum dos políticos quer admitir o fracasso ideológico, o problema está nos povos não está em políticas económicas destruidoras do tecido social, do emprego e do crescimento económico. A comunicação social como aluno bem comportado, passa a imagem que se pretende: os gregos nas esplanadas, os gregos a partir montras, os gregos que se reformam aos 53 anos... Farto de insultos, um blogger grego escreveu um excelente texto chamado “Democracy versus Mythology: the battle in syntagma square”. Recomendo a leitura do texto original, porque este não é um problema grego, é um problema nosso.

É de destacar a forma como a Grécia foi humilhada e atacada na sua soberania e no seu orgulho nacional, como se sente um povo a quem é recomendado vendam as vossas ilhas, vendam a Acrópole? O próprio autor admite que os gregos foram seduzidos pelo modo de vida ocidental e consumista, atraídos pelo credito fácil e pelas taxas de juro extremamente baixas, mas o principal problema foi a corrupção e má gestão do dinheiro público. Não sabemos nós o que isso é? Fala dos artigos de opinião altamente injuriosos e preconceituosos, que não têm em conta a realidade grega e dá exemplos concretos como o número de horas que os gregos trabalham anualmente. Reproduzo aqui o gráfico, dado que Portugal também consta desta estatística. E se não trabalhamos as 2120 horas dos gregos, as nossas 1740 horas batem as 1430 dos alemães... um dado curioso sobre o povo que nos chama de preguiçosos.



O autor desfaz mais alguns mitos quanto à idade da reforma, estão dentro da média da OCDE nos 60 anos e quantos aos níveis de desenvolvimento, a Grécia estava em 22º no ranking de países com maior nível de desenvolvimento em 2008. Mas o maior mito é que o plano de resgate foi efectivamente concebido para salvar os gregos. O objectivo era estabilizar a zona euro, tranquilizar os mercados e ganhar tempo. Se a preocupação fosse a Grécia, está não teria sido obrigada a gastar biliões de euros em armamento comprado à Alemanha e à França.

O ultimo mito: os gregos querem o resgate, mas não o querem pagar. Falso. Os gregos não querem o resgate, porque já aceitaram o primeiro e vêm agora os resultados que não conseguem suportar. Desde cortes nas pensões, suspensão de benefícios sociais, muitos gregos já recorrem à pequena propriedade no campo para sobreviver. Diz o autor, os gregos não estão a lutar contra os cortes, mas sim pelo facto de já não existir onde cortar - “Enough is enough”:

«We will not suffer any more so that we can make the rich, even richer. We do not authorise any of the politicians, who failed so spectacularly, to borrow any more money in our name. We do not trust you or the people that are lending it. We want a completely new set of accountable people at the helm, untainted by the fiascos of the past. You have run out of ideas. »

Este não é um problema grego, é um problema de todos. Somos alvo das mesmas criticas, das mesmas humilhações, dos mesmos cortes odiosos. Está em causa uma batalha pelo direito dos povos à autodeterminação e à soberania contra os interesses do capital financeiro, que nos trata a todos como gado, que só existe para seu beneficio. O sistema que nos querem impor absolve os culpados e faz recair sobre os pobres, os desprotegidos, os trabalhadores honestos o custo dos sacrifícios. Os gregos disseram basta e pergunta o autor o que vão vocês dizer, deixando um ultimo conselho:

«Wake up before you find yourself in our situation»

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