quarta-feira, setembro 19, 2007

NINJA: No Income, No Job or Assets

«Primeiro deixaram de pagar as hipotecas, atitude seguida depois por muita gente da apertada classe média, apesar de os pobres terem sem dúvida tomado a dianteira. Tudo bem, eram hipotecas matreiras, muitas delas feitas de forma a já não serem sustentáveis logo dois anos após a assinatura do contrato. Havia créditos "NINJA", por exemplo, concedidos às pessoas "sem salário, sem emprego nem activos" (em inglês, No Income, No Job or Assets - NINJA). O colunista conservador Niall Fergusen lamenta os baixos níveis de "literacia económica", que permitiram que as pessoas fossem exploradas por empréstimos de alto risco [NT: por já não terem solvabilidade que permita a concessão um empréstimo bancário]. Por que é que estas pessoas de baixos rendimentos não arranjam advogados para analisar os contratos? E já agora, por que é que não têm consultores financeiros?


Depois, numa reacção de esperteza diabólica, os pobres - uma categoria que agora coincide vagamente com a classe trabalhadora - pararam de fazer compras. Quer a Wal-Mart, quer a Home Depot anunciaram performances desanimadoras no segundo trimestre (…) Quando, por exemplo, o maior empregador privado americano, a Wal-Mart, começa a sentir falta de clientes, precisa de se olhar longa e duramente ao espelho. Há cerca de um século, Henry Ford percebeu que a sua empresa só prosperaria se os seus trabalhadores ganhassem o suficiente para comprar um Ford. A Wal-Mart, por outro lado, parece nunca ter percebido que os seus salários cruelmente baixos iriam cercear o seu próprio crescimento, mesmo com os famosos preços de desconto da empresa.


(…) De facto, o crédito fácil tornou-se o substituto dos salários decentes na América. Já houve tempos em que se trabalhava pelo dinheiro, agora era suposto pagar-se por ele. Já foi suposto ganhar-se o suficiente para se poder comprar uma casa com as poupanças. Agora nunca se ganhará assim tanto, mas como diziam os emprestadores - eh eh - nós temos um crédito para si!


O capitalismo global vai sobreviver à actual crise do crédito; o governo apressou-se já a acalmar os mercados agitados. Mas, a longo prazo, um sistema que dependa de extorquir os pobres até ao último cêntimo não pode esperar um prognóstico saudável. Quem poderia imaginar que as penhoras e execuções em Stockton e Cleveland iriam turvar os mercados de Londres e Xangai? Os pobres levantaram-se e falaram; só que parece menos um grito de protesto do que um rouco e estrangulado grito de dor.»


Barbara Ehrenreich, jornalista e escritora norte-americana, autora de "Salário de Pobreza, como (não) sobreviver na América". Site pessoal: barbaraehrenreich.com; blogue ehrenreich.blogs.com/

Via: Esquerda Net


Ao que parece a pobreza e os baixos salários têm mesmo custos económicos e minam o próprio sistema capitalista, quem diria… Será que a revolução mais eficaz é a do bloqueio ao consumo, ao pagamento de créditos e hipotecas? Quais seriam os custos destas formas de acção, se partissem dos NINJAs de todo o mundo? Para já, vemos só o abalo dos mercados como resultado de situações de pobreza e de insolvência financeira. Por quanto tempo, poderá este fenómeno ser ignorado? Terão os ilustres economistas neo-liberais de reconhecer, que afinal Ford tinha razão?


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