sexta-feira, outubro 20, 2006

Quando as crianças deixam de ser crianças

.

«Há três anos que Sara é apelidada de vaca e gorda pelos colegas de turma, sempre que responde às perguntas dos professores nas aulas. Por causa disso, as notas baixaram, e a auto-estima de adolescente também, para níveis perigosamente fracos. Desde que concluiu o 1.º ciclo que Francisco sobrevive num mundo onde quem não joga à bola nem reage à altura a todas as provocações só pode ser maricas. Chegou a ser pendurado com fita adesiva resistente a um poste da escola, pernas, braços e tronco atados a considerável distância do solo. Daniel só tem dez anos e, há poucas horas, um punho cerrado em frente da cara, à qual já tinham sido retirados com violência os óculos, deixou-o a chorar. "Hoje vais morrer", garantiu-lhe o colega.

O Ministério da Educação e as escolas podem não reconhecer o conflito como seu, garantir que representa apenas 5% dos problemas do sistema de ensino - não podem é dizê-lo a estes estudantes. São apenas três faces visíveis - mas anónimas, porque o medo e o estigma chegam muito além dos pátios e das salas de aula - do bullying nas escolas portuguesas. Deste fenómeno, definido como violência psicológica ou física entre pares, entre iguais, há especialistas que garantem poder ser causa de morte, de suicídio - aludindo a alguns casos verificados em Portugal mas nunca catalogados como tal. Noutros países, há relatos fundamentados deste extremo a que pode chegar quem é vítima sistemática de agressão, continuada e persistente - durante dias, meses, anos -, por parte dos colegas.

Daniel chegou à nova escola há poucos dias, dez anos de gente assustados com a imagem de um punho cerrado, desfocado à frente dos olhos sem óculos. "Já tenho alcunha, tenho, sou o orelhas", e foi assim que o chamaram quando lhe garantiram que ia morrer. A agressão não foi consumada, Daniel começou a chorar e a chamar a atenção, está agora no gabinete de gestão de conflitos. Sempre que olhava para o seu agressor, nas aulas, ele dizia-lhe "ainda vais levar". Agora, Daniel planeia mostrar-lhe a cicatriz da operação ao apêndice. "A ver se não me bate." »

in Diário de Notícias (edição online)

A estes casos, acrecento o do João, uma das crianças mais amorosas que eu conheço. Um colega mais velho trancou-o na casa de banho. O João só conseguiu sair com a ajuda de outros colegas, quando se queixou à auxiliar de acção educativa, ela encolheu os ombros e disse:

«Esse miudo, não respeita ninguém, não se aproximem dele»

Ora o menino, não respeita ninguém por isso vamos deixá-lo ir impunemente e se um dia ele se tornar num adulto desprezível, não é nada connosco....

3 comentários:

Anónimo disse...

E incrível, como as escolas estão cada vez piores! Estas criancas sofrem e ninguem faz nada para os ajudar. O que é que a sociedade está a tentar fazer hoje em dia, criar uma futura geração de assustados e de criminais?
Penso que sim, pois quando, nem professores, nem funcionários se preocupam com o bem estar de crianças, que se encontram nessa instituição para aprender e não para serem maltratados, é simplesmente inacreditável, por falta de melhor e apropriada palavra.
Sim eu sei os professores dizem que estão de mãos atadas c/ todas as leis e atitudes dos pais e etc.
Mas de certeza que deve haver alguma coisa que se possa fazer p/ que se possa proteger essas crianças.
Pensem nas crianças e na futura geração que formará o nosso país um dia.

Claudia disse...

Olá miga! O João a que te referes é quem eu penso que é? Olha que a mim até me subiu o sangue e quem teve vontade de pendurar o selvagem que fez isso fui eu! Mas que não há grande coisa que se possa fazer... não há mesmo... as leis protegem os "meninos" e daqui a uns anos vão ver os monstrinhos que criaram.

Hopes disse...

O que se passa nas escolas, em muitas situações, é que os funcionários, professores e o próprio Conselho Executivo evitam punir os meninos. A papelada dá muito trabalho e depois tem que se aturar os papás.
No caso dos professores, a situação é mais complicada. Já assisti a casos de professores que se queixavam da indisciplina, faziam participações e depois eram enxovalhados pelos colegas e pelo Conselho Directivo, que os acusavam de incompetência e de não saber impor disciplina.
Resultado: a maioria dos professores fingia que estava tudo bem, só para não se sujeitar à humilhação pública. Nas turmas a indisciplina alastrava, porque os meninos já sabiam que não lhes ia acontecer nada...

Rainny days,

Sim, é esse mesmo que estas a pensar... Felizmente, acho que a situação está ultrapassada e ele está a gostar bastante da escola nova. Espero que assim continue, porque há muitas crianças que não têm essa sorte...