domingo, maio 29, 2011

Vamos a votos a pensar em quê?

Estas eleições são extremamente curiosas, porque devem ser as primeiras em que não se vão sufragar programas eleitorais, as medidas políticas já estão definidas e três partidos já estão comprometidos com elas. Desta vez não nos podemos queixar de programas eleitorais ou manifestações de intenções que depois não serão cumpridas. Há um acordo com o FMI assinado pelos líderes do PS, PSD e do CDS-PP. É ler o que eu escrevi sobre o que está no memorando da troika, para perceber que não adianta ao PS dizer que vai defender o Estado social, quando o memorando reduz o estado social ao residual, não adianta ao Paulo Portas dizer que vai aumentar as pensões dos seus queridos reformados, quando assinou o congelamento das pensões... E o PSD, não só está comprometido com o memorando porque tem a base ideológica que defende, como ainda pretende ir mais longe nas privatizações e na redução da taxa social única, pretendendo o fim do Estado social. Daí o esforço de esconder o programa eleitoral, porque cada vez que fala nele, desce nas sondagens... Qual deve ser o critério de decisão fundamental dos eleitores, quando decidem em quem devem votar?

O critério é tão simples como isto, o compromisso com as politicas de austeridade selvagem que nos vão retirar direitos sociais e levar o país à bancarrota, deve ser cumprido ou não? Se acha que sim, vote PS, PSD ou CDS-PP (fazendo a ressalva que votar PSD é achar que este pacote não é suficientemente austero e ir mais longe), se acha que não, deverá votar em qualquer outro partido. Vão dizer-lhe que o compromisso com o FMI é inevitável e que nós precisamos do dinheiro. O que não lhe dizem é que se dinheiro acarreta uma dívida que um país em recessão não consegue pagar. Foi o que disseram aos Gregos que agora enfrentam a bancarrota. Também lhe vão dizer que tudo isto é conversa de radical de esquerda. O que não lhe dizem é que o prémio Nobel da economia Paul Krugman admite isso mesmo:

«Os líderes europeus ofereceram empréstimos de emergência aos países em crise, mas apenas em troca de compromissos com programas de austeridade selvagens, feitos sobretudo de cortes da despesa. A objecção de que estes programas põem em causa os seus próprios objectivos - não só impõem efeitos negativos drásticos à economia, mas ao agravar a recessão reduzem a receita fiscal - foi ignorada. A austeridade acabaria por estimular a economia, dizia-se, porque aumentaria a confiança.(...) No entanto, como já disse, a fada da confiança até agora ainda não apareceu. A crise económica nos países europeus com problemas de endividamento agravou-se, como seria de esperar, e a confiança, em vez de aumentar, está em queda livre. Tornou-se evidente que a Grécia, a Irlanda e Portugal não serão capazes de pagar as suas dívidas na totalidade, embora Espanha talvez se aguente.»

Portanto a questão é muito simples, vai acreditar em quem, no prémio Nobel da Economia ou no PS, PSD e CDS?

sábado, maio 14, 2011

Se o memorando da Troika é mau, ainda não leu o programa do PSD

Quem leu os posts anteriores já terá percebido que o plano do FMI, é um verdadeiro homicídio económico e social. Não fosse isso suficientemente grave, o principal opositor ao governo que negociou a sentença de morte, acha que o crime não têm suficientes requintes de malvadez. O PSD acha que se deve ir mais longe. Acha que se devem perder ainda mais direitos sociais, privatizar mais entidades públicas, aumentar o peso do IVA enquanto se reduz a taxa social única para as empresas. Convém perceber o que está em causa, quando se privatiza bens, serviço essenciais ou monopólios naturais. Quando o Estado controla estes sectores garante uma universalidade do acesso, a preços mais reduzidos, preside a lógica do interesse público e não a obtenção de lucro ou as regras do mercado. Veja-se o que aconteceu com a privatização do mercado dos combustíveis, os preços têm vindo a subir descontroladamente e de forma cartelizada, quer o petróleo baixe ou suba. É isso que queremos que acontece aos comboios, ao metro, ao correio, à água? Sim, nem a empresa Aguas de Portugal escapa ao plano de privatizações do PSD! Isto só acontece em 2 países no mundo, porque já se trata de monopólio natural e tem um valor essencial inegociável. Imagine-se o que seria lucrar com a captação de água, pagava-se o que fosse preciso porque não há alternativa. Quando a lógica é o lucro, podemos perguntar quem vai garantir que uma aldeia em Bragança tenha acesso a serviços, se o custo é muito mais elevado? Alguém vai querer saber se há cidadãos que não podem pagar a factura?

E o que dizer da taxa social única? É o imposto que as empresas pagam para assegurar que o acesso à segurança social dos trabalhadores… vamos colocar em causa as reformas futuras, a sustentabilidade do sistema? Para proteger de igual forma grandes empresas altamente lucrativas como a Cimpor e a Jerónimo Martins e as pequenas empresas, retirando o ónus do imposto mais cego e injusto, o IVA? Mas que raio de distribuição de sacrifícios é esta? O IVA pesa mais no bolso dos que têm pouco, porque há bens que não podem deixar de consumir? Mais sacrifícios, quando quem os podia fazer não faz? Os economistas do PSD falam em descidas de 4, 8 a 12 pontos percentuais (cada voz sua sentença, como é hábito). então um país endividado a precisar de receitas, vai abdicar de 3 a 4% do PIB?? Mas isto é racional? Na cabeça dos ultra-liberais é, porque as suas empresas aumentarão os lucros e os parvos dos cidadãos entram com os tais 3 a 4% do PIB, porque afinal não vivem do ar e vão ter que suportar o IVA. Esclarecido? Então vá lá votar nesta lógica dos mesmos do costume... sem esquecer que o PS se comprometeu também na redução da TSU, só não diz em quanto!

segunda-feira, maio 09, 2011

O que vem no memorando na Troika e não convém que se saiba o que significa - Parte III

Nesta terceira parte, vamos ver como se pretende atacar duramente os direitos laborais, de uma forma anti-constitucional, especialmente gravosa para quem depende exclusivamente da sua força de trabalho. Comecemos por ver o que acontece, a quem fique desempregado:

«Redução do desemprego de longa duração, reduzindo o subsidio de desemprego para 18 meses, tecto máximo do subsidio 1000 euros e redução de 10% no subsidio passados 6 meses de desemprego, facilitar a transição entre ocupações, firmas e sectores; o subsídio de desempregado será alargado aos trabalhadores independentes que tenham prestado serviços a uma só empresa, numa base regular»

Parte-se do princípio que quem fique desempregado consegue arranjar emprego num espaço de um ano e meio, o que em Portugal com o estímulo à criação de emprego, é tarefa fácil. Aliás até se pressupõe que em 6 meses se resolve a situação, porque já se está a cortar 10% do subsídio. Veja-se o drama para quem já auferia um salário baixo antes de ser afectado pelo desemprego… Por outro lado o facilitar a transição entre ocupações, significa que as pessoas poderão ter que aceitar um trabalho numa função diferente. E já agora, atenção à salvaguarda no acesso dos trabalhadores independentes ao subsídio, uma medida que seria justa, não fosse vincular a prestação de serviço a uma só entidade, numa base regular. Quem tiver prestações a várias entidades, já não tem direito ao subsidio…

«Reforma dos contratos de trabalho, indemnizações reduzidas de 30 para 10 dias por ano de trabalho, os despedimentos individuais ligados ao desajustamento do trabalhador às condições de trabalho são possíveis mesmo que não exista introdução de novas tecnologias ou mudanças no local de trabalho; a extinção do posto de trabalho não precisa de estar vinculada à antiguidade na empresa, sem que exista obrigação de transferir o trabalhador para uma função idêntica; aumento da flexibilidade horária e adopção do banco de horas; revisão do pagamento de horas extraordinárias em 50% e eliminar a compensação de horas por dias de ferias, só haverá aumento do salário caso aumente a produtividade.»

O capítulo da reforma dos contratos de trabalho é explica-se a si próprio. O esforço e dedicação anual de um trabalhador à empresa valem somente 10 dias de trabalho. O despedimento fica facilitado porque a inadequação do trabalhador, deixa de ter que ser justificada. Se a Troika conhecesse o termo “razão atendível” proposto pelo PSD, teria sido colocado aqui. A empresa nem tem que fazer uma tentativa de colocar o trabalhador numa outra função. Por outro lado, quem não for despedido, será sujeito à flexibilidade horária, o que na pratica significa trabalho fora de horas, que o banco de horas sugere que não será pago, e caso as horas extra sejam pagas, seja domingo ou feriado nunca excedem os 50% do valor habitual… Tendo em conta que na maioria dos trabalhos, quem cumpre a sua hora, já é olhado de lado e quem recebe horas extra as faz, para compensar um magro salário, o panorama não é bonito. Mas piora quando se afirma claramente que só existirá aumento salarial, se a isso corresponder aumento da produtividade. Se pensarmos que o trabalhador não controla nem os factores de produção, nem a gestão e organização do trabalho pelas chefias e muito menos os custos de produção, como poderá garantir o aumento da produtividade só por si? Tendo em conta a falta de qualidade dos gestores e os elevadíssimos custos de produção no nosso país, há produtividade como? Pode contar com congelamento ou mesmo redução salarial… Mas afinal, isto é um bom acordo, não é?

domingo, maio 08, 2011

O que vem no memorando na Troika e não convém que se saiba o que significa - Parte II

Continuando o post anterior, mais medidas do memorando da troika. Acerca da banca, das privatizações e das empresas públicas: venda-se o ramo de seguros da CGD, o que faz todo o sentido pois dá lucro a um Estado que precisa de dinheiro, encontrem um comprador para o BPN até Julho, nem que seja ao preço mínimo, porque afinal quem pagou aquilo foram os parvos dos contribuintes, bem se pode vender por tuta e meia, sem recuperar o dinheiro (também deve ser fácil, aparecer um comprador até Julho que em 2 anos não apareceu). Segue-se um capitulo sobre a forma generosa como o Banco de Portugal ajudará a banca nacional a obter financiamento… Sem comentários

«Proibição de novas parcerias publico-privadas e revisão das actuais PPP»
Possivelmente a única coisa digerível neste memorando, mas peca por não explicar quanto é que isso vai custar ao estado, dado que existem indemnizações compensatórias…

«Privatização progressiva das empresas publicas (aeroportos Portugal, ANA, CP carga, CTT, GALP, EDP, REN, Caixa Seguros)»
Mais uma vez, não há preocupação com o lucro para o Estado, estes sectores podiam contribuir para a receita do Estado. Mas a agenda da Troika é ideológica, é neoliberalismo puro e duro, independentemente da viabilidade económica da medida… quanto ao cidadão que usa o comboio (fala-se especificamente das linhas suburbanas e do transporte de mercadorias que dão lucro), pode preocupar-se e muito e começar a pensar em alternativas. E o que dizer dos CTT, quantos serviços dão lucro? Deixe de contar com eles… e prepare-se para deixar de ter isenção de IVA nos serviços de correio...

«Reforma na administração pública, redução dos gestores públicos, reavaliação de fundações e similares, reorganização do poder local, aglutinação e centralização de serviços públicos; mobilidade e flexibilidade dos recursos humanos, visando uma redução de 1% ano na administração Central e 2% na local»
Para além dos cidadãos que ficam prejudicados por ver câmaras municipais, juntas de freguesia e balcões de serviços públicos encerrar, isto significa redução de pessoal e piores condições para quem fica e tem que ser flexível. Ainda acredita que não vão existir despedimentos?

«Reforma do SNS: Controlo de gastos na saúde, com poupança a nível farmacêutico de 1.2 do PIB, aumento das taxas moderadoras, redução de 30% no orçamento da adse, adm e sad, reorganização da rede hospital, especialização e concentração de hospitais, aglutinando serviços, reduzindo pessoal e horas extraordinárias, relocação e mobilidade de funcionários, reduzir custos com transportes de pacientes em 33%; flexibilização do horário de trabalho»
O significa reduzir 1.2% do PIB com medicamentos? Significa que as comparticipações serão reduzidas à insignificância e serão os utentes a suportar a maior parte ou a totalidade dos custos com medicação. E sim, são os mesmos que têm de suportar a duplicação das taxas de IVA com reformas de 200 euros... Mesmo quem tenha adse deve preocupar-se, porque em 2 anos, pretende-se reduzir o orçamento em metade, quantas comparticipações ficam de fora? O mais preocupante é a reorganização e concentração da rede hospitalar que pressupõe certamente encerramento de hospitais. Também se fala em reduzir horas extraordinárias, isto é, tente não adoecer fora de horas ou espere mais tempo para ser atendido. E é bom ter o seu próprio transporte para chegar ou sair do hospital, porque os custos com transporte de pacientes são reduzidos em 33%...

(continua...)

sábado, maio 07, 2011

O que vem no memorando na Troika e não convém que se saiba o que significa - Parte I

Anunciado o acordo com a Troika, ficaram as pessoas muito tranquilas, porque não há cortes nos salários e não vão perder os 13º e 14º meses. O que não lhes disseram, foi que existem uma serie de outras medidas, que lhes vão custar mais que dois meses de salário. O que lhes dizem é que se trata de um bom acordo. Analisemos algumas medidas que eu tirei do memorando, para ver o bom que é. Vamos fazer isto por partes, porque ainda são 34 páginas e porque tudo de uma vez, é capaz de causar danos à saúde. Cá vai o inicio:

«Redução dos custos com educação em 195 milhões de euros, racionalizar a rede escolar e reduzir os custos de pessoal»
Como é que se reduz custos, racionalizando a rede escolar? Só uma forma, encerram-se escolas e para se atingir 195 milhões de euros, não serão duas ou três. Bem podem as pessoas deixar ter como garantida uma escola para os filhos… E a redução de custos de pessoal, não significa despedimentos?

«Congelamento de salários e promoções no sector publico»
Já estamos habituados, mas quando temos que pagar mais impostos e o custo de vida aumenta exponencialmente (como veremos a seguir), o congelamento de salários passa rapidamente a perda efectiva de rendimento.

«Redução de custos com empresas publicas em 415 milhões»
Não seria mau, se isto não afectasse os correios e as empresas de transporte. Está preparado para ver o custo do passe mensal dobrar ou triplicar ou mesmo para ver o transporte que usa reduzido ou suprimido?

«Corte em 150 milhões nos benefícios fiscais às empresas e 150 milhões nos benefícios fiscais aos particulares, colocando tectos máximos nas deduções em habitação e saúde»
Isto significa que o Estado retém mais impostos, os cidadãos não serão reembolsados mesmo que tenham encargos que o justifiquem. Menor rendimento anual…

«Aumento da receita do IVA em 410 milhões, alterando a categoria de bens e serviços dos escalões reduzidos e intermédio para o escalão máximo, aumento de impostos (automóveis, tabaco e electricidade)»
Esta medida só por isso demonstra a bondade do acordo! São capazes de calcular o aumento de preço de um produto cujo IVA passa de 6 para 13%, ou de 6 para 23%. É o caso do gás e a electricidade, nada essenciais... Como vão as pessoas com reformas de 200 euros suportar este aumento dos bens essenciais? Não vão, aliás nem quem ganha um salário mínimo e alguém está preocupado? Não, foi um bom acordo!

(continua...)

sexta-feira, maio 06, 2011

"Força"

FORÇA

As gaivotas despenharam-se sobre o mar,
o seu voo a pique silenciou as estrelas.



Fiquei sem o universo,
as estradas cortadas com a tempestade
tornaram-se angústia
onde nevava, nevava, nevava.

Perante os castelos desfeitos,
não escolhi a compensação
ou o meu sentimento de tragédia.

Olhei para o caminho
e descobri uma pedra deixada pelo teu olhar.
Sem a companhia do universo,
fiquei apenas com a tua pedra.

Joel Henriques
"Terra Prometida"