terça-feira, janeiro 19, 2010

Inadaptado

«Terei uma única ideia original na cabeça?
Na careca cabeça?
Talvez se fosse mais feliz, o meu cabelo não caísse.
A vida é curta, tenho de aproveitá-la ao máximo.
Hoje é o primeiro dia do resto da minha vida.
Sou uma frase-feita ambulante...
O médico vai mesmo ter de me observar a perna,
há nela um caroço qualquer.
O dentista voltou a ligar, já lá devia ter ido.
Se não adiasse coisas seria feliz,
mas passo a vida de cu sentado.
Se o meu cu fosse menor era mais feliz,
não tinha de usar fraldas da camisa para fora.
Como se enganasse alguém...
Devias voltar ao jogging, bucha,
correr uns quilómetros por dia.
Correr a sério, desta vez.
Ou fazer alpinismo.
Tenho de mudar mesmo de vida.
Mas como? Tenho de me apaixonar,
de arranjar uma namorada.



Tenho de ler mais, de me cultivar.
E se aprendesse russo?
Ou um instrumento?
Podia aprender chinês,
Seria o guionista que fala chinês
e toca oboé. Ia ser giro.
Devia usar o cabelo curto
e parar de fingir a mim e a todos
que tenho montes de cabelo.
É tão patético...
Devo ser verdadeiro, confiante,
Não é isso que atrai as mulheres?
Os homens não têm de ser bonitos.
Hoje-em-dia isso não é verdade,
Agora há quase tanta pressão
sobre nós como sobre elas.
Por que sinto ter de pedir
desculpas por existir?
Talvez o meu problema seja
a química errada no meu cérebro,
todos os meus problemas e ânsias
serem devidos a um desequilíbrio
químico ou dissociação de sinapses.
Tenho de consultar um médico...
Mas continuaria a ser feio,
Quanto a isso, nada a fazer.»

"Adaptation" 2002

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