As palavras que perdi ontem...
Detesto quando isto acontece. Ontem pensei num texto muito razoavelzinho para postar no blog. Acontece que não tinha onde escrever. Hoje que tenho o écran vazio à minha frente, não me sai nada de espirituoso. Podia tentar lembrar-me das palavras, mas já não saem da mesma forma. Não ia adiantar. Mais vale articular um discurso inflamado contra as incursões israelitas na faixa de Gaza. Os bombardeamentos a supostos ninhos de terroristas ceifam a vida de centenas de civis inocentes, mas esse é sempre um dano colateral justificado. É um argumento que se torna aborrecido, já para não julgar a ética e a moral de quem o profere. E atenção que o meu discurso inflamado aplica-se também ao Hamas, aos turcos e ao terrorista que se explodiu junto a uma escola no Paquistão.
O meu texto de ontem não era sobre a guerra. Era sobre estar acorrentado a uma realidade que não se quer viver. O que até tem muito a ver com o que estou a escrever agora. Quem havia de querer esta realidade? Bombas como prendas de Natal, subtilmente para ninguém ver, para ninguém se indignar. Sim indignar-se! Que mais pode um acorrentado fazer, senão indignar-se.
No meu texto de ontem falava de uma fuga para um mundo, onde ninguém me consegue acorrentar, onde eu sou livre de gritar o que quero. Soava bem melhor ontem. Uma fuga para puder ser quem eu sou. Ia fazer o que eu sei fazer bem e não o que me obrigam a fazer. Se calhar também ia mudar o mundo, mas adormeci antes dessa parte. Lembrei-me porque tinha essas correntes, tinha de sobreviver, tinha de comer e de pagar uma casa. Não fosse alguém pensar que desacorrentar-me era uma opção.
A fuga era real, lembro-me agora. A fuga era esta. Este écran vazio. O meu blog. O meu mundo virtual. Isso não me tiram, aqui não me podem acorrentar. Aqui vejo quem eu sou e o que sou capaz de fazer. Vi o valor que as correntes não me deixam ver. Vi-me a mim, já me tinha esquecido quem eu era. Ontem sorri e sentia-me bem. Sim, aqui não me podem acorrentar e sim aqui posso mudar o mundo. Pena é que essas palavras se tenham perdido para sempre... Escrevo outras, escrevo sempre...
1 comentário:
escreveste outras, e escreveste muito bem :D
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