quinta-feira, janeiro 13, 2011

Sobre o “Inside Job – A verdade da crise”

Finalmente consegui ir ver o “Inside Job – A verdade da crise”. Vale mesmo a pena ver, não só pelas revelações das promiscuidades entre os banqueiros/políticos/economistas, que isso já não é novidade, mas sobretudo pelas entrevistas aos protagonistas da crise e verificar as respostas e justificações que dão. É assustador verificar que ficamos na dúvida, se as pessoas são desonestas e sabem que o são e não se importam, ou se pior ainda, não percebem que estão a fazer algo desonesto porque já estão formatados para pensar friamente na obtenção do lucro, sem qualquer espécie de noção ética. Dou um exemplo. Num dos excertos das comissões de inquérito no senado, um senador pergunta a um dirigente da Goldman Sachs, baseado num mail de um colaborador seu, referindo-se uma determinada empresa como sendo uma “merda”, porque é que ele vendia aquela empresa aos clientes/investidores como lucrativa. Interrogava-se se ele não achava que isso era fraude. A resposta foi que a preocupação com cliente era apenas na perspectiva do dinheiro que lhe daria a lucrar e não com a verdade. O único problema ali foi que o colaborador não devia ter escrito essa informação num e-mail.

É impressionante como não só não se vê qualquer sentido de ética, como também não existe a mais elementar noção de bem ou mal… Ao contrario deste dirigente, um tipo que rouba uma carteira, sabe que está a fazer mal, o que mostra como estas pessoas são extremamente perigosas. E o mais espantoso, é que nenhuma acusação formal foi feita, nenhum processo judicial está em curso. Aliás quando o Estado injectou os primeiros milhares de dólares, para tentar resgatar a AIG, a contrapartida era que esta não agisse judicialmente contra a Goldman Sachs por fraude.

Mas voltando aos protagonistas da crise, tenho que destacar Frederic Mishkin. Professor de economia da escola neoliberal pura e dura, que como os seus colegas, enriqueceu e ganhou prestigio a vender artigos, estudos ou serviços de consultadoria financeira a países/empresas pró-desregulação, até chegar à Reserva Federal. Este senhor escreveu uma obra bastante séria sobre a economia da Islândia, financiada pelo próprio governo islandês, a elogiar a estabilidade do sistema financeiro, isto já com indícios que aquilo ia rebentar. E quando o jornalista pergunta em que se baseou ele, gaguejou «nas informações a q tive acesso», percebe-se na expressão dele, que não tinha como fundamentar nada, aquilo teve tanto de investigação científica como a astrologia. E a melhor é que o estudo chamava-se "Financial Stability in Iceland" e convenientemente no CV actual do Professor, o livro chama-se "Financial Instability in Iceland"… por isto recebeu 124 mil dólares.

São pessoas como Mishkin que estão no governo a bloquear medidas de regulação do sistema financeiro, que fazem lobby junto do Senado, que estão na Goldman Sachs, em bancos de investimento como o Merril Lynch e nas famosas agencias de rating, Moody's, a Standard & Poor's e a Fitch. Foram estas agências que classificaram de AAA instituições de crédito e empresas que apresentaram falência dias depois, as mesmas que hoje especulam com a nossa divida. E apesar das evidências de falta de credibilidade, continuam a fazer o que sempre fizeram sem qualquer supervisão, processo judicial, numa total impunidade… Os contribuintes pagaram e vão continuar a pagar a pesada factura da recessão, do desemprego, da perda de poder de compra e de qualidade de vida. “Inside Job – A verdade da crise” mostra claramente como isso aconteceu e quem são os culpados.

1 comentário:

Bruno Ramalho disse...

quero muito de ir ver isto! Obrigado pela escrita excelente, como é habitual. :D