terça-feira, agosto 31, 2010

“O governo corrompe-se pela corrupção, e quando há corrupção na democracia, a corrompida é a democracia”

«À escala internacional, a corrupção atinge hoje, na era da globalização neoliberal, uma dimensão estrutural. A sua prática tem-se banalizado à semelhança de outras formas de criminalidade corruptora: malversação de fundos, manipulação de contratos públicos, abuso de bens sociais, criação e financiamento de empregos fictícios, fraude fiscal, dissimulação de capitais procedentes de actividades ilícitas, etc. Confirma-se assim que a corrupção é um pilar fundamental do capitalismo. O ensaísta Moisés Naím afirma que, nos próximos decénios, “as actividades das redes ilícitas do tráfico global e seus sócios do mundo 'legítimo', seja governamental ou privado, terão muitíssimo mais impacto nas relações internacionais, nas estratégias de desenvolvimento económico, na promoção da democracia, nos negócios, nas finanças, nas migrações, na segurança global; enfim, na guerra e na paz, do que até agora foi habitualmente imaginado".

Segundo o Banco Mundial, a cada ano, no mundo, os fluxos de dinheiro procedentes da corrupção, de actividades ilícitas e da evasão de fundos para os paraísos fiscais atinge a astronómica soma de 1,6 biliões de euros… Desse montante, 250.000 milhões correspondem à fraude fiscal realizada anualmente só na União Europeia. Reinjectados na economia legal, esses milhões permitiriam evitar os actuais planos de austeridade e ajuste que tantos estragos sociais estão a causar.

Nenhum dirigente deve esquecer que a democracia é essencialmente um projecto ético, baseado na virtude e num sistema de valores sociais e morais que dão sentido ao exercício do poder. Afirma José Vidal-Beneyto, no seu livro póstumo e de indispensável leitura, que quando, numa democracia, “as principais forças políticas, em plena harmonia mafiosa, se põem de acordo para trapacear os cidadãos”, produz-se um descrédito da democracia, uma repulsa da política, um aumento da abstenção e, mais perigoso, uma subida da extrema direita. E conclui: “O governo corrompe-se pela corrupção, e quando há corrupção na democracia, a corrompida é a democracia”.»

Ignacio Ramonet in "Le Monde Diplomatique"

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